Alunas do Curso de Nutrição da UFSC auxiliam restaurante a produzir refeições sem utilizar gordura trans
A rotina do restaurante Due Regine, localizado no bairro Saco Grande, em Florianópolis, mudou. Seja para produzir a massa do macarrão, ou o recheio de uma torta, todas as vezes que as cozinheiras vão para a cozinha, já sabem: nada de gordura trans. A orientação é resultado de um trabalho realizado por Djuliana Corsi, Mariana Glória e Juliana Pastore, nas disciplinas Administração de Serviços de Alimentação 1 e 2, do Curso de Nutrição da UFSC. O projeto foi orientado pela professora Rossana Pacheco da Costa Proença, do Departamento de Nutrição, e por Vanessa Martins Hissanaga, mestranda nessa área.
Durante as disciplinas Administração de Serviços de Alimentação 1 e 2, ministradas para sétimas e oitavas fases, cada grupo desenvolve as aulas práticas em um restaurante de Florianópolis. Nestas atividades são analisadas as condições de funcionamento dos estabelecimentos e sugeridas modificações para melhorar a qualidade das refeições servidas. Depois de analisar a grande quantidade de gordura trans na receita dos alimentos e considerar o risco que representa na alimentação contemporânea, as estudantes Djuliana, Mariana e Juliana escolheram esse tema para o seu trabalho. No levantamento de necessidades do restaurante, também confirmaram que esse era uma abordagem estratégica: “Vimos que esta era a principal urgência do restaurante, e a proprietária apresentou-se disposta a resolvê-la”, lembram as alunas.
Uma das orientadoras do trabalho, a professora Rossana Proença, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Nutrição em Produção de Refeições (NUPPRE) da UFSC, define e alerta: “A gordura trans é uma invenção. Ela é uma gordura em uma forma que não existe na natureza ou que existe muito pouco. O organismo não a reconhece como um alimento que possa aproveitar bem. A partir de uma determinada quantidade, que é muito pequena, ela começa a ser acumulada e passa a ser tóxica para o organismo”.
Levando em conta esse problema, as estudantes alertaram Vânia Regina Fornasari, proprietária do restaurante Due Regine, sobre a necessidade de substituir alguns ingredientes na hora de preparar as refeições. Vânia admitiu que nunca havia pensado sobre isso, mas aceitou o desafio. “Em um primeiro momento fiquei apreensiva, mas o resultado foi ótimo. Os clientes não perceberam a diferença no sabor, o que era minha principal preocupação”, conta. Este também era o principal desafio para Juliana, Djuliana e Mariana. “O grande problema era manter o sabor, por isso fizemos alterações sutis: adotamos temperos naturais, trocamos a margarina pelo óleo”, exemplificam.
Este e outros estudos desenvolvidos pelo Núcleo de Pesquisa de Nutrição em Produção de Refeições (NUPPRE) romperam os limites da UFSC e tiveram repercussão nacional. Em abril de 2008, uma equipe do programa Globo Repórter, da Rede Globo, veio até a UFSC e fez uma matéria abordando a questão da gordura trans. Além de citar o trabalho no restaurante, o programa mostrou um estudo sobre sobremesas saudáveis, desenvolvido como Iniciação Científica pelas acadêmicas Greyce Luci Bernardo e Jeanine Schutz Cardoso, sob orientação da mesma professora. Segundo Rossana, a divulgação nacional foi importante para esclarecimento das pessoas. “Sem informação não se pode mudar comportamentos. É importante o trabalho de divulgação do que é a gordura trans, dos riscos que oferece e, principalmente, de indicação de outras alternativas”.
O tema será também assunto de um curso (Controlando o uso de gorduras trans), que será ministrado por Vanessa, Mariana, Juliana e Djuliana, no segundo semestre de 2008. A organização é da Empresa Junior de Nutrição da UFSC. O assunto é ainda foco de estudos no Mestrado em Nutrição. Propor um método de controle da utilização de gorduras trans na produção de refeições é o desafio da dissertação de Vanessa Martins Hissanga, que tem orientação da professora Rossana Proença (Pós-Graduação em Nutrição) e parceria da professora Jane Mara Block (Programa de Pós-Graduação em Ciência dos Alimentos ). O trabalho deve ser finalizado até fevereiro de 2009, estando prevista a publicação de um livro pela Série Nutrição da Editora da UFSC.
Da sala de aula para a cozinha
A orientação para substituição da gordura trans é exemplo de como a parceria entre o Departamento de Nutrição da UFSC e restaurantes de Florianópolis propicia troca de experiências e garante a integração entre ensino, pesquisa e extensão. As disciplinas Administração em Serviços de Alimentação 1 e 2 fazem com que os alunos saiam das salas de aula e entrem, literalmente, na cozinha. A atividade é mais uma proposta do curso de oferecer equilíbrio entre a teoria e a prática para melhor formação dos futuros nutricionistas.
Desde 2005, as atividades práticas das disciplinas são realizadas durante todo o ano letivo a cada módulo das disciplinas, culminando com o denominado mini-estágio de quatro semanas no final do ano. Nesse mini-estágio, os alunos desenvolvem atividades de melhoria nos locais, a partir das análises realizadas durante os meses anteriores. Cada grupo de três a quatro estudantes fica responsável durante um ano por um estabelecimento, com a orientação de um professor.
As mudanças são definidas pelos alunos, professores e proprietários dos estabelecimentos. Normalmente, os próprios funcionários dos restaurantes alertam a equipe sobre deficiências do local. Os trabalhos resultam em orientações de cardápio, formação de operadores e até em propostas para reformas nas cozinhas.
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Mais informações com a professora Rossana Proença ou com Vanessa Hissanaga, pelo telefone 3721 9020 ou pelo site www.nuppre.ufsc.br
Saiba Mais:
A gordura trans e seus efeitos
– A gordura trans começou a ser usada em larga escala nos anos 80, para dar mais gosto, melhorar a consistência e até aumentar o prazo de validade de alguns alimentos. Ela é obtida depois que os óleos vegetais são submetidos a um procedimento químico chamado hidrogenação, que os solidifica. O resultado é uma gordura mais grossa, que foi batizada com o prefixo latino “trans”, mesmo nome de sua estrutura molecular interna.
– As principais fontes de gordura trans são a margarina, sobretudo a vendida na forma de tablete, as massas prontas para o consumo e temperos prontos. A margarina em tablete é normalmente usada em recheios de bolachas, em salgadinhos, tortas e bolos.
– Devido sua origem laboratorial – não existe na natureza – o organismo humano não possui os componentes necessários para digerir a gordura trans. Ela vai sendo acumulada no organismo.
– A Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou em 2004 a Estratégia Global para Promoção da Alimentação Saudável, Atividade Física e Saúde. A meta estabelecida é a eliminação total do consumo de gorduras trans industriais. No Brasil, o Guia Alimentar da População Brasileira restringe um limite de consumo correspondente a 1% do valor energético diário total, aproximadamente 2 g/dia.
Por Cecilia Cussioli / Bolsista de Jornalismo na Agecom