Especial Pesquisa: Liberação de estudos com células-tronco embrionárias estimula trabalho na UFSC
Com a aprovação do uso de células-tronco embrionárias nas pesquisas brasileiras, novas perspectivas se abrem em laboratórios de todo o país – e também na UFSC. Uma das frentes de trabalho que deverá ser reforçada é a Rede Nacional de Terapia Celular, iniciativa que integra cerca de 40 pesquisadores do Brasil. O governo federal anunciou R$ 21 milhões para a rede, que vai trabalhar com células-tronco embrionárias e também adultas.
“O Ministério da Saúde vê esse recurso como investimento. Há uma visão de aplicabilidade no SUS que é muito importante e ousada”, comemora o professor da UFSC Marcio Alvarez-Silva, único representante de Santa Catarina na Rede Nacional de Terapia Celular. Pesquisador do Laboratório de Neurobiologia e Hematologia Celular e Molecular, ligado ao Departamento de Biologia Celular, Embriologia e Genética, ele diz que o Estado precisa se organizar para dar força à pesquisa com células-tronco e para preparar projetos que possam ser beneficiados com os recursos que serão destinados aos estudos nesse campo.
“Santa Catarina é um estado que tem visão tecnológica e não deve ficar para trás”, avalia o professor que nutre o sonho de que as pesquisas com células-tronco sejam ampliadas e permitam inclusive que o Estado possa, no futuro, pleitear junto ao Ministério da Saúde recursos para implantação de um Centro de Terapia Celular.
Por enquanto, o pequeno número de cientistas trabalhando com células-tronco no país é um gargalo que precisa ser gerenciado também na UFSC e em Santa Catarina. Na Federal de Santa Catarina, apenas dois professores (Andréia Trentin e Marcio Alvarez-Silva ), ambos do Departamento de Biologia Celular, Embriologia e Genética, ligado ao Centro de Ciências Biológicas, pesquisam células-tronco.
Mas Alvarez-Silva lembra que há potencial para incentivo a novos pesquisadores junto a cursos de pós-graduação da UFSC, como os de Enfermagem, Farmácia, Neurociências e Biotecnologia – programas que têm a visão da medicina regenerativa (aquela que prioriza a recuperação de lesões no corpo a partir da utilização de material celular, e não por meio de medicamentos).
Conquistas
Mesmo que tenha apenas um grupo trabalhando com células-tronco, a UFSC já conquistou resultados importantes em seus estudos. E poderá também se adequar para a pesquisa com as células-tronco embrionárias. Para isso deverá fazer convênios com clínicas de fertilização.
As células-tronco obtidas a partir de embriões são preferidas por pesquisadores de todo o mundo, pois são as mais versáteis. São classificadas como totipotentes, ou pluripotentes, pois podem se converter em vários tipos de tecidos. Mas, diante da proibição que persistia no país para pesquisas com embriões, células tronco-adultas obtidas em outros materiais vêm sendo estudadas.
Na UFSC, as células-tronco adultas são obtidas a partir de cordão umbilical e de placentas dos partos realizados no Hospital Universitário. Com esse material os pesquisadores estudam a transformação em dois tipos específicos de células-tronco: as hematopoéticas (ligadas à geração dos diversos constituintes do sangue) e as mesenquimais (que podem gerar células nervosas).
Com as células-tronco mesenquimais os trabalhos já entraram em fase de pesquisa pré-clínica, em modelos animais. Em estudos anteriores foram bem-sucedidos os experimentos para, a partir de uma célula-tronco adulta isolada, obter diferenciação para uma célula nervosa. Agora estas células diferenciadas estão sendo enxertadas em camundongos para observações sobre regeneração de lesões no cérebro e em nervos periféricos.
De acordo com o professor Alvarez-Silva, as pesquisas ajudarão na busca a respostas para diversas questões. Entre elas, se o enxerto deve ser no local da lesão, ou inoculado no sangue, por via intravenosa, e quantas células são necessárias para recuperar uma lesão, por exemplo. “Há também previsão de testes para avaliar o uso de células-tronco na recuperação do AVC (acidente vascular cerebral), talvez já no próximo semestre”, informa o professor.
Outra frente de pesquisas é a amplificação de células-tronco hematopoéticas, para que possam ser usadas em transplantes de medula. Alvarez-Silva explica que uma das limitações nos estudos com cordão umbilical e placenta é o pequeno número de células-tronco presentes nestes tecidos. Por isso há pesquisas direcionadas à amplificação dessas células em laboratório. “É uma tecnologia importante para a produção maciça de células”, explica o professor.
Atualmente há no Brasil pelo menos 1.500 pacientes portadores de leucemia (câncer que compromete o desenvolvimento dos glóbulos brancos) e de outras doenças genéticas e auto-imunes, que necessitam de um transplante de medula óssea e não têm doador compatível. Estes pacientes estão cadastrados em uma fila de espera do Redome (Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea). A maioria é vítima da leucemia, doença que só no ano passado matou 4.460 crianças e adultos, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCa).
“O uso de células-tronco obtidas de placenta e cordão umbilical é uma alternativa para a falta de doador compatível, apresentando ainda redução de até 50% dos índices de rejeição em relação a um doador adulto”, explica o professor. Segundo ele, por serem “imaturas” imunologicamente, pois estão em um estágio muito primário de desenvolvimento, as células-tronco hematopoéticas de cordão umbilical têm mais chances de serem bem aceitas pelo receptor.
Com as pesquisas a UFSC espera colaborar com a determinação da melhor condição de cultura para a amplificação de células-tronco hematopoéticas, estabelecendo um protocolo para aumentar a possibilidade do sucesso terapêutico. Também pretende definir protocolos para amplificação e reprogramação de células-tronco mesenquimais e hematopoéticas para aproveitamento racional de tecidos ricos neste tipo de célula.
Mais informações com o professor Marcio Alvarez-Silva / Laboratório de Neurobiologia e Hematologia Celular e Molecular / 48 3721 5553/ 3721 6905
Por Arley Reis / Jornalista da Agecom