Escritora Suzana Mafra participa do Círculo de Leitura na EdUFSC

Suzana: também cronista do jornal A Notícia
Em 2006, venceu o Palco Habitasul, na categoria verso, e recentemente foi finalista de uma promoção da Rocco, com uma carta para Clarice Lispector. Também publicou textos em coletâneas e em revistas (Babel – Revista de Poesia, Conto e Poesia e O Papasiri) e é autora do blog www.borboletrasnoquintal.blogspot.com
A escritora morou em Florianópolis, onde cursou a faculdade de Biblioteconomia. Trabalha na Biblioteca Pública de Brusque, onde criou o Mural Permanente de Poesia. É mestre em literatura pela UFSC e cronista do jornal A Notícia. Seu livro “Borboletras”, que faz parte da coleção Ipsis Litteris da EdUFSC, reúne 52 “poemínimos” escritos entre 1999 e 2001 e que navegam por cinco temas principais: a escrita, o social, o sonho, Eros e o sagrado. Usa o tempo livre para escrever, mesmo sabendo que “é preciso preparar a terra, ou seja, reservar-se tempo para nada fazer, divagar ou ler”.
O Círculo de Leitura é um projeto que permite ao convidado e aos presentes discutirem informalmente sobre os livros que estejam lendo, as leituras do passado e as influências de outros autores sobre o seu trabalho. Escritores e jornalistas como Oldemar Olsen Jr., Fábio Brüggemann, Inês Mafra, Mário Pereira, Maicon Tenfen, Cleber Teixeira, Dennis Radünz, Rubens da Cunha, Renato Tapado, Raimundo Caruso, Nei Duclós, Marco Vasques, Raquel Wandelli e Mário Prata foram alguns dos participantes das etapas anteriores do projeto.
Entrevista com a autora
Quais foram suas experiências mais marcantes em relação à leitura? Em sua casa, na infância e na adolescência, havia um ambiente de estímulo ao contato com os livros e o conhecimento?
Suzana Mafra – Venho de uma família numerosa, de 13 irmãos. Meus pais pouco estudaram, mas minha mãe tinha o hábito de nos contar ou ler histórias à noite ou quando íamos à roça, durante o descanso do sol quente sob alguma árvore. Muitas das histórias que ela contava ou lia constavam na Bíblia ou na História Sagrada (adaptação dos evangelhos bíblicos em narrativa fluente). Nosso irmão mais velho era seminarista e quando foi embora deixou uma estante de livros didáticos ou religiosos. Aquela estante foi a biblioteca da família. Inês Mafra, irmã escritora, ainda morava em Brusque e acrescentou alguns títulos àquela biblioteca-estante. Dois livros deste acervo foram lidos e relidos por mim lá nos meus oito ou nove anos, lembro-me das capas puídas e rasgadas. Eram coletâneas de poemas. Sentia o ritmo dos versos e sabia que aquilo era muito bom.
Da primeira à quarta série, numa escola pública multiseriada no interior de Brusque, eu levava livros para ler em casa. Lá pelos nove ou dez anos fui assídua freqüentadora da biblioteca do SESI, que ficava a uns dois quilômetros de casa. Então descobri os livros de Laura Ingalls Wilder, ambientados num universo parecido com o meu. Mais tarde freqüentei a Biblioteca Pública de Brusque, passei a ler José Mauro de Vasconcelos e me apaixonei por Hermann Hesse. Em casa sempre teve muito gibi, um de meus irmãos foi representante comercial, comprava gibis na intenção de preencher a solidão dos hotéis. Toda sexta ou sábado nos trazia uma remessa nova. Monteiro Lobato conheci através da tevê. A partir dos 14 comecei a trabalhar e a comprar obras por meio do Círculo do Livro.
Que livros e autores mais a sensibilizaram? Que tipo de leitura prefere hoje e o que está lendo no momento?
Suzana – A história de leitura conta muito de uma pessoa. Os autores que me fascinavam escreviam temas relacionados ao meu universo interior ou à leitura que fazia de meu universo exterior. Apesar de religiosa, sempre fui questionadora. Em 1986 fui morar em Florianópolis, para cursar a faculdade, e virei atéia. Na época, meu autor preferido era Franz Kafka. Quando li sua biografia, senti: Kafka sou eu. Pois tudo que lhe doía, doía em mim também. Naquela época trabalhava menos do que hoje, sobrava mais tempo para a leitura. Mas o melhor da leitura chega na maturidade, com a experiência de vida e de leitura. Você percebe logo se o estilo é bom.
Devo ter uns mil livros em casa; é pouco, mas dá pra viajar bastante. Fiz muitas doações para a biblioteca em que trabalho. Em compensação, empresto muita coisa de lá. Gosto de Leminski, Hilda Hilst, Cecília, Cora Coralina, Bandeira, Quintana, Drummond, Adélia,Vinicius… Minha meta era não citar nenhum poeta estrangeiro, mas abro uma exceção para Fernando Pessoa, Sylvia Plath, Bashô e para dizer que amo o poema O albatroz, de Baudelaire. Paralelo à leitura de ficção e poesia, mantenho uma leitura de livros espirituais. Bhagavad Gita e Bíblia compõem a lista de meus livros de cabeceira.
Como escritora, por quem se considera influenciada? Que autores e títulos podem ter contribuído para “construir” seu trabalho poético?
Suzana – Não sei exatamente. Acredito que sou influenciada por tudo que me cerca. Volta e meia, quando escrevo, sinto que não estou sozinha. Chego a ver a silhueta do autor que me observa. E não estou falando de psicografia. Com certeza sou influenciada pelas leituras que fiz ao longo da vida, mas não saberia precisar. Percebe-se que minha poesia tem influência do concretismo. Entre os livros que me marcaram posso citar “A hora da estrela”, de Clarice Lispector (após ler este livro decidi que seria escritora. Isso tem uns sete anos). A poesia de Leminski me instiga a escrever. Há também “A redoma de vidro”, de Sylvia Plath, e “Paris é uma festa”, de Ernest Hemingway (ambas leituras recentes, do ano passado).
Minhas paixões atuais (das quais falarei no Círculo, quinta-feira): duas escritoras brasileiras quase da minha idade. Uma delas é Adriana Lisboa, de prosa altamente poética, que recebeu o Prêmio José Saramago. Escreveu, entre outros, “Rakushisha”, “O beijo de Colombina” e “Língua de trapos” (infantil). Mantém o blog www.caquiscaídos.blogspot.com. Outra é Claudia Roquette-Pinto, que faz poesia e ganhou o Prêmio Jabuti. É autora de “Corola” (o melhor livro de poesia lançado no Brasil recentemente, na minha opinião).
Sendo bibliotecária e pessoa que acompanha os passos dos universitários e jovens em geral, como vê a convivência das novas gerações com os livros e a leitura?
Suzana – Semanas atrás estive na Biblioteca da UFSC e me deparei com uma novidade: sofás estilo “puf” no salão de entrada. Contei dez sofás. Todos ocupados. Esperei em vão. Nenhum vagou para que eu também aproveitasse aquela delícia. Detalhe: ninguém dormia. Todos liam deliciosamente. Adorei a idéia. As bibliotecas precisam de coisas assim, aliar conforto e prazer à leitura, sem esquecer o lado técnico, claro.
Você acredita que tem escola que ainda coloca aluno de castigo na biblioteca? Você acredita que tem escola sem biblioteca ou com bibliotecas fechadas? Que há anos o Conselho Regional de Biblioteconomia se empenha junto aos governos do Estado para fazer um concurso para bibliotecários coordenarem e dinamizarem estas bibliotecas, sem retorno, apenas promessas? Muitas bibliotecas de escolas públicas estaduais não abrem ao público em horário integral e algumas praticamente não abrem. A escola precisa sim de uma biblioteca viva, atuante.
Em relação à existência de bibliotecas públicas nos municípios de Santa Catarina, a situação melhorou consideravelmente a partir dos programas lançados pela esfera federal.
Acho importante manter a obrigação de leitura para o vestibular. Muitos usuários chegam à biblioteca assustados com a grossura dos livros e por fim, ao devolvê-lo, demonstram-se contentes, descobrem o prazer da leitura. Como pode alguém prestar vestibular sem nunca ter lido um livro? Ou alguém ser professor sem gostar de ler?
Como convive com as novas mídias e suportes de leitura, como a internet? E de que forma seleciona suas leituras, diante de tantas possibilidades oferecidas na web e da avalanche de edições de livros no Brasil?
Suzana – Sigo minha intuição. Mantenho um blog, o Borboletras no Quintal
www.borboletrasnoquintal.blogspot.com (saiu na revista Bons Fluidos de junho). Também sou leitora de blogs. Leio alguma coisa de jornais e revistas na web, o jornal Rascunho, por exemplo, mas não na íntegra, é muito esforço. Para leituras maiores prefiro o suporte de papel.
Sou uma navegante. Aproveito as navegações para minhas duas profissões: de bibliotecária e escritora. Um dos melhores momentos de uma bibliotecária é comprar bons livros para o acervo da biblioteca. Ver o sorriso dos usuários. Textos curtos como a crônica e o poema funcionam bem na internet. Tem muito livro bom e bonito sendo publicado, o que é ótimo.
A internet funciona bem como canal de divulgação e venda. Caberá ao consumidor (leitor) ter a esperteza de saber o que lhe servirá. Daí a importância da escola e da biblioteca.
Contatos com Suzana Mafra podem ser feitos pelos telefones (47) 3355-3827 e 9928-8725 e pelo e-mail suzanamafra@terra.com.br.
Por Paulo Clóvis Schmitz /Jornalista da Agecom