ESPECIAL PESQUISA: Consumo de medicamentos em comunidades indígenas é tema de dois estudos da UFSC
Duas pesquisas coordenadas pela professora Eliana Diehl, do Departamento de Ciências Farmacêuticas do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFSC, pretendem mostrar como acontece o consumo de remédios industrializados em três comunidades indígenas de Santa Catarina. Através da abordagem conjunta de aspectos antropológicos e epidemiológicos, a professora procura traçar o perfil do consumo e as percepções que os próprios usuários têm sobre esse tipo de remédio.
Os projetos “Medicamentos no contexto local indígena Guarani (litoral de Santa Catarina)” e “Medicamentos nos contextos locais Kaingáng e Xokleng (Santa Catarina)” estão inseridos no Programa de Pós-Graduação em Farmácia e fazem parte do Grupo de Pesquisa “Medicamentos em Contextos Locais Indígenas”, do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil, organizado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Liderado por Diehl, esse grupo procura desenvolver pesquisas que envolvem as percepções e usos de medicamentos por diferentes povos indígenas brasileiros, tendo como referenciais teóricos e metodológicos a antropologia e a saúde pública/epidemiologia. “Além de contribuir para as pesquisas nessa área, que são muito escassas, os dados coletados podem ajudar a melhorar o atendimento à saúde em comunidades indígenas”, explica Diehl.
Remédio da farmácia
Trabalhando com a perspectiva de que existem diferentes formas terapêuticas para tratar um mesmo problema, a pesquisa quer verificar de que forma os remédios industrializados são apropriados e utilizados por essas comunidades. “Eles reinterpretam os medicamentos a partir do uso cotidiano”, diz a professora. A existência desses medicamentos, entretanto, não resulta em desprezo pelo conhecimento tradicional. Diehl afirma que os índios “usam e gostam do ‘remédio da farmácia’, assim como também podem ir ao curandeiro e tomar ‘remédios do mato’”.
Em uma aldeia Kaingáng, a professora encontrou a ilustração perfeita da convivência entre os conhecimentos científico e tradicional. Em entrevista, um “curador” lhe descreveu o preparo de um remédio contendo algumas plantas, noz moscada, cravo, canela e Novalgina®. À receita aprendida com o pai, ele acrescentou o remédio industrializado por sugestão da mulher. “Ela teria se consultado em um hospital, quando alguém disse que esse remédio era bom para o coração e para os nervos.” O que era um analgésico e antitérmico foi então resignificado pela experiência e passou a ser entendido como um medicamento que “acalma o coração”.
Os projetos contam com as colaborações de Jean Langdon, professora do Departamento de Antropologia da UFSC, e do Núcleo de Estudos de Saúde e Saberes Indígenas (NESSI), do qual a professora Eliana faz parte. Para ela, essa interdisciplinaridade permite que, ao final do trabalho, tenha-se “um retrato farmacoepidemiológico contextualizado pela visão antropológica, contribuindo para a consideração de que são legítimos outros saberes no campo da saúde e não somente aqueles delimitados pelo saber médico oficial”.
Saiba Mais
Medicamentos no contexto local indígena Guarani (litoral de Santa Catarina)
Iniciado em 2006, o projeto tem a colaboração da mestranda Francielly Grassi, do Programa de Pós-Graduação em Farmácia. Já na segunda coleta de dados, a pesquisa está sendo feita na Comunidade Guarani do Morro dos Cavalos, que ainda não é uma terra indígena legalmente reconhecida. Financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa Catarina (Fapesc), o trabalho esteve presente na 6ª Semana de Ensino Pesquisa e Extensão da UFSC e voltará a ser apresentado em outubro, no 2º Congresso Brasileiro Sobre o Uso Racional de Medicamentos.
Medicamentos nos contextos locais Kaingáng e Xokleng (Santa Catarina)
Iniciada este ano, a pesquisa é uma continuidade da tese de doutorado da professora Eliana Diehl e tem a colaboração das estudantes de graduação Maria Carolina Bortolli e Fernanda Manzini, bolsistas voluntárias de Iniciação Científica. Financiado por um edital conjunto do Ministério da Saúde e do CNPq para pesquisas direcionadas ao estudo sobre saúde dos povos indígenas, o trabalho compara os resultados encontrados pela professora entre 1997 e 2001 com o contexto atual. Por enquanto foram recolhidos dados na Terra Indígena Xapecó, localizada nos municípios de Ipuaçu e Entre Rios, que possui 11 aldeias Kaingáng. Os resultados preliminares já foram apresentados no 4º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, realizado em Salvador, e na 7ª Reunião de Antropologia do Mercosul, realizada em Porto Alegre. A pesquisa com os Xokleng, da região de Ibirama, deve começar no próximo ano.
Por Daniel Ludwich / Bolsista de Jornalismo na Agecom
Mais informações:
Eliana Diehl – elianadiehl@hotmail.com – 48 3721-5077
Francielly Grassi – franciellygrassi@hotmail.com – 48 3721-5077