Pesquisa comprova presença do subtipo C do vírus da AIDS em Santa Catarina
A UFSC está colaborando com o entendimento sobre a complexidade da AIDS. Estudo recente desenvolvido na universidade foi aceito para publicação em um conceituado jornal da área de virologia – o Journal of Medical Virology – e confirma cientificamente o panorama de prevalência do subtipo C do vírus HIV em Santa Catarina. O estudo foi desenvolvido pelo Laboratório de Imunologia Aplicada, ligado ao Departamento de Microbiologia e Parasitologia do Centro de Ciências Biológicas da UFSC. O mesmo laboratório participa de pesquisas para desenvolvimento de uma vacina contra a AIDS e este ano submeteu ao Ministério da Saúde projeto para estudar a resistência de subtipos do vírus HIV aos coquetéis de medicamentos.
A diversidade do vírus
Uma das principais características do vírus HIV é sua diversidade genética, sendo classificados em tipos, grupos, subtipos e formas virais recombinantes. Assim como acontece na América Latina, Europa Ocidental e Estados Unidos, no Brasil existe um predomínio do subtipo B. Em São Paulo, por exemplo, 90% dos indivíduos soropositivos apresentam esse vírus.
Na Região Sul, no entanto, há indicações de que prevalece o vírus do subtipo C – mas essa premissa é baseada em estudos que foram realizados principalmente com amostras coletadas no Rio Grande do Sul. Levantamentos específicos para o Paraná e Santa Catarina são raros até o momento.
A pesquisa realizada na UFSC e aceita para publicação no Journal of Medical Virology comprova que o subtipo C está presente no Estado. O estudo foi realizado a partir de 100 amostras de sangue coletadas em pacientes atendidos no Hospital Regional de São José, que recebe pacientes de todo o Estado. Entre as amostras analisadas, 48% apresentaram esse subtipo, 23% foram classificadas como subtipo B e o restante das amostras são formas recombinantes, ou seja, um misto entre os subtipos B e C. Trata-se da primeira descrição científica do subtipo de vírus HIV circulante em Santa Catarina. Os estudos foram realizados a partir de técnicas de biologia molecular e seqüenciamento genético do vírus.
De acordo com o professor Aguinaldo Roberto Pinto, um dos coordenadores dos trabalhos relacionados à AIDS na UFSC, estudos do gênero são estratégicos para conhecimento da doença. Há especulações entre os estudiosos de que a diversidade do vírus pode estar associada a maior ou menor capacidade de transmissão da doença. O subtipo C seria uma linhagem mais facilmente transmissível – quantidades menores de vírus já possibilitariam sua transmissão. “São indicações sobre a epidemiologia da doença que fazem com que alguns pesquisadores acreditem que a AIDS está mudando no Brasil e pode ser que o vírus do subtipo B seja substituído pelo C”, comenta o professor.
Segundo ele, esse tipo de conhecimento é também importante para proteção contra a AIDS, pois a grande diversidade entre os subtipos tem representado um desafio para o desenvolvimento de vacinas. A expectativa entre os pesquisadores é de que no futuro estes estudos possam colaborar com o desenvolvimento de vacinas específicas para os diferentes subtipos do vírus. Há também possibilidades de que estas informações possam colaborar com tratamentos específicos, permitindo a escolha de diferentes coquetéis com base no tipo de vírus que atinge o paciente.
Resistência a medicamentos
O grupo que integra o Laboratório de Imunologia Aplicada da UFSC quer ampliar as pesquisas e submeteu este ano um novo projeto ao Programa Nacional de DST e AIDS, do Ministério da Saúde. A idéia é dar continuidade aos estudos sobre o subtipo de vírus HIV prevalente em Santa Catarina, estendendo a pesquisa também para o Paraná. Se for aprovado, o financiamento vai ainda permitir que a UFSC estude a resistência de diferentes subtipos do vírus HIV aos medicamentos.
O grupo da UFSC alerta no projeto que Santa Catarina é um dos estados brasileiros que apresenta umas das mais elevadas taxas de incidência de AIDS, mas nenhum estudo foi realizado até o momento para detectar a presença de mutações que tornam o vírus resistente aos anti-retrovirais. Com o projeto o grupo espera obter informações que respondam a duas perguntas: “Quais os subtipos de HIV que estão circulando nos Estados do Paraná e Santa Catarina” e “Quais as principais mutações que conferem resistência primária à anti-retrovirais e estão presentes no HIV circulante nos Estados do Paraná e Santa Catarina”.
A proposta prevê o envolvimento de 200 pacientes que ainda não começaram a receber medicações e que são atendidos em três cidades: São José (SC), Maringá (PR) e Londrina (PR). Unidades de saúde nestes municípios já foram contactadas e concordaram em participar do estudo.
O novo projeto envolve uma série de instituições, sendo coordenado pela UFSC. Se aprovado vai permitir a cooperação científica entre UFSC, Universidade Estadual de Londrina, Universidade Estadual de Maringá e Instituto Adolfo Lutz, de São Paulo. Vai também promover a integração entre as universidades e os serviços clínicos que atendem indivíduos soropositivos. Os dados serão utilizados em trabalhos acadêmicos e permitirão a formação de recursos humanos capacitados na área de epidemiologia molecular do HIV.
Mais informações com professor Aguinaldo Roberto Pinto, Fone (48) 3721.5206, E-mail: pintoar@ccb.ufsc.br
Por Arley Reis / Jornalista da Agecom
Saiba Mais
AIDS na Região Sul
– De acordo com Boletim Epidemiológico do Programa Nacional de DST e AIDS, do início de 1980 até junho de 2006, o Ministério da Saúde contabilizou 77.639 casos de AIDS na Região Sul.
– Dos 100 municípios brasileiros com maior número de casos de AIDS, mais de 80 deles estão nas regiões Sul e Sudeste.
– Na Região Sul as taxas de incidência são as mais elevadas do país.
Diversidade
– O HIV sofreu algumas modificações genéticas, desde que, provavelmente, passou do macaco para o homem, formando diferentes subtipos de vírus.
– O HIV-1 é o causador da epidemia mundial de AIDS e pode ser dividido em três grupos: M, O e N.
– O grupo M é responsável por 99% dos casos de AIDS no mundo e pode ser subdividido em distintos subtipos (A, B, C, etc…)
– No Brasil, existe um predomínio do subtipo B, semelhante ao que acontece em toda a América Latina, Europa Ocidental e Estados Unidos.
– A Região Sul do país, porém, apresenta incidência crescente de HIV-1 do subtipo C, variante presente em 83% dos indivíduos infectados na China, Índia e África Sub-Saariana.
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