Pesquisa analisa homicídios na Região Metropolitana de Florianópolis
“Acusados de homicídio representados por advogados remunerados pelo réu têm mais possibilidades de serem absolvidos”. Baseada em dados numéricos e leitura de processos, esta é uma das conclusões da pesquisa que analisou o fluxo de funcionamento do Sistema de Justiça Criminal nos processos penais (no total 183) para o crime de homicídio doloso entre 2000 e 2003, na Região Metropolitana de Florianópolis/SC. A pesquisa considerou os municípios de Florianópolis, São José, Palhoça e Biguaçu. Os processos foram acompanhados até 2006.
Os dados pesquisados por integrantes do Laboratório de Estudos das Violências (Levis), ligado ao Departamento de Antropologia da UFSC, mostram quantitativamente as diferenças em relação ao acesso à justiça. Dos 47 acusados encontrados nos 37 processos julgados, 62% possuíam defensor cedido pelo Governo e, neste caso, foram constatadas 79% de condenações e apenas 21% de absolvições. Já nos casos em que o defensor era constituído (pago pelo réu) houveram 56% de condenações contra 44% de absolvições. Dessa maneira, ainda que seja preliminar, o estudo indica o acesso diferencial à justiça conforme a capacidade de contratação privada do acusado.
Um dos dados encontrados que mais chama a atenção é o fato de apenas 20% dos processos analisados terem chegado a julgamento. Os demais processos se encontravam em trâmite, suspensos ou arquivados, sendo que desses últimos, 48% foram arquivados por permanecerem sem solução, pois depois da finalização do inquérito os resultados mostravam que não havia evidências suficientes para chegar ao possível autor do crime. Portanto, a pesquisa constatou que, até agora, apenas uma parcela muito reduzida dos homicídios chegou até ao último estágio da justiça criminal, ou seja, ao julgamento.
Outro dado importante encontrado pelo estudo relativo à trajetória dos processos é o que se refere ao tempo de tramitação dos casos. Segundo os dados encontrados, entre o crime e o julgamento dos acusados há um tempo médio de espera de dois anos, sendo que em 75% dos processos que foram julgados os acusados foram condenados.
Segundo a pesquisa, a questão do tempo de processamento, assim como o fluxo de justiça, são temas praticamente inexplorados no Brasil. “Atualmente pouco se sabe sobre o tempo médio de duração das etapas processuais como inquérito, denúncia, sentença etc. A questão do tempo é revelador, pois mostra dois fatores importantes: o funcionamento da justiça e o tratamento dado aos crimes e aos criminosos”.
O estudo analisou também uma série de outros dados sobre as características dos homicídios e o perfil social dos envolvidos. Dos 183 processos analisados, por exemplo, 75% ocorreram em Florianópolis. No total dos processos pesquisados a maioria ocorreu em via pública, com a utilização de arma de fogo (73%) durante a noite ou madrugada, e com a morte da vítima quase que instantânea (72%). As idades das vítimas concentravam-se entre 15 e 25 anos, enquanto a maioria dos agressores possuía idade menor ainda, entre 15 e 20 anos (90% das vítimas e 96% dos acusados eram homens). Curioso é que em 55% dos casos havia algum tipo de relacionamento entre a vítima e o acusado. Em poucos casos (cerca de 2%) as pessoas eram completamente desconhecidas. Em 43% não há informações sobre a existência ou não de vínculo.
A pesquisa também constatou, segundo dados da Secretaria de Estado da Saúde, que na Região Metropolitana de Florianópolis(Florianópolis, São José, Palhoça e Biguaçu) houve um aumento significativo dos casos de homicídio no período de 2000 a 2003. Os números praticamente triplicaram: passaram de 64 para 168 casos registrados. Chama a atenção também o fato da grande maioria dos homicídios ter ocorrido na cidade de Florianópolis (150 casos).
De acordo com o relatório da pesquisa enviado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), no Brasil o instrumental teórico no campo da violência ainda está em construção. Por isso, é fundamental para a sociedade e para as políticas governamentais em segurança pública um aprofundamento dos estudos nesta área.
O texto do relatório afirma que diante da abrangência da pesquisa é evidente que haverá um aprofundamento mais detalhado dos dados coletados. O estudo ainda destaca que pesquisas do gênero são de grande importância em função da ausência de tradição estatística das instituições de segurança pública e de justiça. Há, portanto, carência de fontes de dados e necessidade de se construir um modelo interpretativo da violência.
Mais informações: 3721 – 9890, ramal 22 (Levis – Laboratório de Estudos das Violências/UFSC)
Por Lívia Helena Freitas / Bolsista de Jornalismo na Agecom



























