Livro da Editora da UFSC aponta fatores culturais para masculinização do campo
Não são apenas fatores econômicos que provocam a fuga dos jovens do campo. São determinantes questões relacionadas à realização pessoal “destes moços e moças”, sobretudo o acesso à educação, à cultural e ao lazer. Ao não receberem remuneração, até porque não são os donos da terra,também ficam impedidos de investir e recriar valores. O diagnóstico,resultado de pesquisa científica, é aprofundado no livro O mundo rural no horizonte dos jovens, de Valmir Luiz Stropasolas, publicado pela Editora da UFSC (EdUFSC). A obra tem lançamento confirmado para o dia 31 de outubro, às 19h , no Hall da Reitoria da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
O pesquisador, que também enfatiza a masculinização da atividade
rural, é engenheiro agrônomo, mestre em Sociologia Rural e doutor em
Ciências Humanas. Stropasolas atua desde 1984 em instituições do setor público agrícola, sendo atualmente responsável, junto à Epagri, pela parte de capacitação do Projeto Microbacias II, desenvolvido com recursos do Banco Mundial (BIRD). Uma bolsa na França permitiu, por exemplo, realizar estudos comparativos da realidade européia com a situação catarinense e brasileira.
Deixando de lado estereótipos e lugares comuns que costumam aparecer em pesquisas sobre êxodo rural, o livro aponta os vieses do gênero e geração expressos no movimento migratório de jovens e a tendência de envelhecimento e masculinização da população rural, problemáticas que vêm marcando o processo de reprodução da agricultura familiar nas regiões coloniais do Sul do Brasil, e especialmente no Oeste de SC.
As pesquisas e reflexões sobre a temática objetivam contribuir para a formulação de políticas públicas com vistas à inclusão social da juventude rural. A obra, em síntese, mostra as redefinições sociais e culturais em curso no mundo rural na perspectiva dos jovens, colocando em relevo as representações e práticas diversas e conflituosas dos filhos e filhas de agricultores familiares no que tange à reprodução social (trabalho, família, casamento, lazer etc). Dá, enfim, visibilidade às mazelas estruturais externas e internas ao mundo rural, ressaltando, entre outros aspectos, as hierarquias de poder e as desigualdades de gênero e geração na agricultura familiar, fatores considerados essenciais para compreensão
do movimento migratório de jovens para os centros urbanos.
Segundo constata Stropasolas, o acesso à renda e à remuneração
“adequada” do trabalho agrícola familiar é restrito a uma pequena parcela de famílias. Significa que “ainda existe um enorme contingente da agricultura familiar que permanece à margem das políticas e projetos vigentes, seja porque não se enquadra nos padrões dominantes, seja porque se depara com enormes dificuldades para acessar os recursos disponibilizados pelas instituições”.
Para ele, o movimento migratório é resultante das inúmeras, contínuas e pequenas iniciativas que buscam a construção de uma identidade social. “O fato de os jovens migrantes buscarem mudanças que questionam valores nucleares da agricultura familiar, redefine mas não anula o papel do ambiente cultural rural no processo de socialização e no comportamento futuro deste juventude?.
O livro possibilita entender os significados expressos nas
representações, expectativas e práticas dos filhos e filhas de
agricultores familiares. Ao ?dar vez e voz aos jovens?, o autor procura explicitar as complexas mudanças em curso, abrindo portas para inserção dos diversos segmentos da juventude rural à sociedade”.
Ao apresentar a obra, a professora Maria de Nazareth Baudel
Wanderley, da Unicamp e pesquisadora do CNPq, sublinha o caráter universal da publicação. “A análise ultrapassa de longe o simples interesse local, tornando-se uma referência para a compreensão das particularidades da vivência dos jovens rurais”.
No prefácio, Maria Ignez S. Paulillo, professora titular da UFSC e autora das obras de referência na área, lembra que as mulheres são as mais tolhidas, sendo raramente contempladas com herança em terra. Por isso, ocorre hoje, tanto no Brasil como na Europa, a masculinização do campo. “O significado do casamento tem um nítido recorte de gênero que Valmir explora com sensibilidade e competência”, escreve.
À luz da noção de rural como um “encontro de construções sociais em conflito”, o autor considera que “foi possível desvendar a visão dos ‘esquecidos’ no espaço rural”, os “outros” na agricultura familiar, ?particularmente jovens e mulheres?.
A pesquisa demonstra ainda que o retorno ao campo das jovens é menos provável, “exceto quando valorizadas com uma profissão alcançada na cidade”. Já os rapazes revelam maior interesse na volta por não estarem se acostumando com a cidade. Voltariam, no entanto, com a idéia de conquistar a independência gerencial e financeira em relação aos pais. Esta representação não é compartilhada pelas jovens que projetam o seu horizonte profissional e pessoal para além das porteiras de uma propriedade agrícola, reforçando a tendência de masculinização da atividade rural.
O mundo rural no horizonte dos jovens
Valmir Luiz Stropasolas
Editora da UFSC (EdUFSC)
346 pg. R$ 34,00
Informações com o autor Valmir Luiz Stropasolas pelos fones (48)
9927-8868, 3338-4134 ou 3239-5642.