REUNIÃO ANUAL DA SBPC: simpósio discutiu o papel da agricultura familiar no Brasil
Há alguns anos estamos acostumados a ouvir que a agricultura é um dos carros-chefes da economia brasileira, que equilibra a balança econômica e que cresce, sustentada pelas virtudes do agronegócio. Por trás destas afirmativas, porém, esconde-se outro cenário, que diz respeito muito mais à realidade social do que aos números absolutos. Praticada em 4,1 milhões de estabelecimentos rurais, a agricultura familiar é responsável por 10% do PIB (Produto Interno Bruto), levando em conta toda sua cadeia produtiva. Entretanto, ao compararmos essa atividade com o agronegócio, veremos logo que os dois campos não se desenvolvem da mesma maneira. Enquanto o agronegócio prospera calcado em políticas públicas, a agricultura familiar patina, não sendo atendida suficientemente pelo crédito governamental e tampouco dispondo de uma agenda política que a sustente.
O tema foi discutido por Sérgio Schneider (UFRGS), Fábio Luiz Búrgio (Consultor do Ministério do Desenvolvimento Agrário) e Lauro Mattei (UFSC), na manhã desta quinta-feira (22/7), durante a 58ª Reunião da SBPC. Expondo estatísticas a respeito da produção agrícola e principalmente das particularidades da agricultura familiar, os pesquisadores chamaram atenção para a necessidade de políticas públicas apropriadas para o setor. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), por exemplo, financia apenas 27% das famílias rurais. As diferenças regionais também são contundentes: o Sul fica com 40% dos recursos. Fabio Búrgio ressaltou o desafio de “incluir mais o segmento menos capitalizado”. Centrado sobretudo na produção de mercadorias consumidas a baixo custo pela sociedade, a categoria não trabalha com os lucros extensivos do chamado ‘agribusiness’.
Indispensável ao país, a agricultura familiar é responsável pelo abastecimento de produtos do dia-a-dia, como o feijão. Possibilitar sua permanência e expansão no campo é vital, já que 85% dos estabelecimentos agropecuários são deste tipo. O êxodo rural e conseqüente favelização urbana nas décadas de 70 e 80, decorrentes da “revolução verde”, são um alerta neste sentido.
Por outro lado, os expositores reconheceram a significativa importância econômica do agronegócio. A ele pode, em grande parte, ser creditado o montante de 38.6% do PIB gerado no campo. O avanço da mecanização e a abertura de novas fronteiras agrícolas pelo setor aumentaram constantemente a produção brasileira. Isso foi possível graças ao apoio do estado, cujo plano de desenvolvimento agrário se baseou neste modelo. No entendimento de Lauro Mattei essa política unidirecional foi responsável pela heterogeneidade negativa hoje presente no meio rural.
Sérgio Schneider também alertou para a questão ambiental. Citou a monocultura – “carro-chefe do agronegócio” – como um fator preocupante, principalmente o estabelecimento das plantações de soja no cerrado e sua expansão na Amazônia. Como alternativa Schneider citou a existência de 106 milhões de hectares, atualmente usados na pecuária extensiva, e que podem ser ocupados pelas plantações, poupando a mata nativa.
Por Manfred Mattos / Bolsista de Jornalismo na Agecom