Conservadorismo da TFP é tema de tese do Programa de Pós-Graduação em História

19/06/2006 15:11

A atuação política e cultural do movimento católico conhecido como TFP é um dos temas pesquisados no Laboratório de Religiosidade e Cultura (LARC) da UFSC. A sigla TFP é a abreviação de Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, entidade que tem como base a luta pela manutenção e fortalecimento desses três valores. A doutoranda Gizele Zanotto, do Programa de Pós-Graduação em História, é quem estuda a TFP em sua tese, mesmo enfrentando algumas dificuldades para obter informação sobre os ritos e práticas internos do movimento, resultado dos segredos que a envolvem e que são conhecidos apenas por seus principais membros.

Esse caráter misterioso da entidade se alia a uma postura de diferenciação e isolamento dos associados frente a tudo que não faz parte da doutrina ensinada na TFP. Desde sua fundação, na década de 60, a entidade difunde a idéia de que seus membros seriam eleitos por Deus, formando uma elite religiosa de pessoas mais dignas que as demais, por acreditarem fazer parte do único grupo que defende, em nossos dias, a doutrina católica autêntica, verdadeira, livre de desvios e liberalizações litúrgicas, teológicas e rituais.

Essa diferenciação é facilmente percebida através do estilo incorporado pelos membros da entidade, que deve refletir a sobriedade exigida pela associação. Os tefepistas, como são chamados os que fazem parte da TFP, podem ser identificados pelas suas vestimentas sociais, cabelo bem aparado, porte, gestos contidos, ou pelo porte de elementos identificadores da própria TFP, como o estandarte vermelho com leão rompante ou a capa vermelha sobre os ombros.

Uma das principais doutrinas que norteiam a TFP é o Integrismo Católico. Originado na Europa do século XIX, esse ramo do catolicismo baseia-se na negação do modernismo e de qualquer característica que advenha desse movimento. Defende uma militância ativa na proteção do catolicismo tradicional, em oposição ao catolicismo de engajamento social. Nesse sentido, a associação acredita que é impossível conciliar a Igreja com a sociedade moderna e que é necessário restaurar a ordem monárquico-católica, inspirada na cristandade medieval do século XIII, quando a Igreja influenciava todos os âmbitos da sociedade.

Assim, a TFP se posiciona contra qualquer indício de modernização e combate temas como divórcio, progressismo católico, aborto, imoralidade televisiva, homossexualismo e, principalmente, a reforma agrária, que para os tefepistas representa a porta de entrada para o comunismo no país, doutrina amplamente combatida pela associação e permanentemente qualificada como atéia, materialista e anticristã.

Dentro da TFP também é difundida a idéia de traços milenaristas, de que será implantado no mundo o Reino de Maria, uma nova era sacral e cristã por excelência, que seria marcada por um profundo respeito aos “direitos” da Igreja, pela sacralização da vida, pelo espírito de hierarquia e pela diligência em detectar e combater o mal, de acordo com as palavras do próprio fundador e líder da associação, Plínio Corrêa de Oliveira.

Esse reino foi idealizado pela própria TFP, e apenas os membros da entidade teriam acesso a ele, mentalidade que origina o sentimento de predestinação dos tefepistas. O próprio Plínio, depois de se auto-intitular profeta, anunciou a chegada de uma catástrofe mundial, da qual apenas os puros se salvariam, (leia-se os tefepistas e algumas almas ainda não contaminadas pelos germes deste mundo espúrio e pecador) para depois desfrutar o novo reino, implantado por Cristo e pela Virgem Maria.

O intenso conservadorismo da associação fortaleceu a TFP durante as primeiras décadas de sua criação, mas também propiciou uma ruptura entre os “membros mais liberais”, situação que foi intensificada com a morte do líder Plínio Corrêa (1995). A partir daí, uma parte da entidade, que correspondia a 80% do total de tefepistas, acabou se separando da TFP e formou uma nova associação, os Arautos do Evangelho, que obteve o reconhecimento de Associação Internacional de Direito Pontifício em 2001, e que também administra a Associação Cultural Nossa Senhora de Fátima, o Colégio Arautos do Evangelho Internacional e os Cavaleiros do Novo Milênio.

Essa entidade é liderada por José Clá Dias, antigo “braço direito” de Plínio, que possui idéias mais liberais e que submeteu o novo grupo às leis e regras da Igreja Católica, o que não acontece com a TFP.

Apesar do desfalque sofrido com a saída de José Clá Dias, a TFP ainda é uma associação atuante dentro de seus círculos, e está constantemente procurando novos adeptos, mesmo entre os jovens mais carentes – apesar do elitismo constante na sua prática e sua doutrina. A entidade, que inicialmente surgiu na capital paulista, já esteve presente em 23 países dos cinco continentes, como Estados Unidos, Alemanha, Argentina, Equador, África do Sul e Índia.

No Brasil, a maior concentração de membros da TFP está em São Paulo, enquanto que aqui em Santa Catarina não há, oficialmente, nenhuma sede da entidade. Mesmo que timidamente, mantendo o ar misterioso em torno da associação, a TFP atua na sociedade de hoje, levando em frente a luta pela tradição, pela família e pela propriedade, mesmo que esses valores, na visão tefepista, sejam privilégios de alguns eleitos – seus próprios membros.

Mais informações com Gizele Zanotto, pelo e-mail: zanotto@cfh.ufsc.br e também no site do laboratório: <a href=http://www.cfh.ufsc.br/~larc/

>http://www.cfh.ufsc.br/~larc/

Por Julia Fecchio / Bolsista de Jornalismo da Agecom