Por que uma revista de astronomia?
Por que editar uma revista de astronomia no Brasil? Esta pergunta, que possivelmente já terá sido feita, tem várias respostas.
A primeira delas deve-se ao fato de a astronomia ser interdisciplinar e, neste sentido, fazer interagir todos os campos do conhecimento e não apenas os reconhecidos como de natureza estritamente científica. É o caso da literatura, ou mesmo da arquitetura.
Em 1848 o poeta e novelista norte-americano Edgard Allan Poe (1809-1849) publicou um de seus livros menos conhecidos, Eureka, onde se perguntou pela primeira vez porque a noite é escura. Nesta obra, cujas vendas decepcionaram seu autor, Allan Poe atribuiu a escuridão noturna ao fato de o universo ser finito.
Se o universo fosse infinito, considerou ele, a quantidade de estrelas infinitas tornaria o céu seria tão claro que a noite não seria escura.
Conhecido na astronomia como Paradoxo de Olbers o problema da escuridão noturna foi incorporado à astronomia como uma questão cosmológica que surgiu inicialmente na literatura.
Já a geometrização do espaço, preparando um conceito em que ser apoiaria a mecânica clássica, aparece no início do século 15 (o Quattrocento), inicialmente como um jogo de luz e sombras. Por volta de 1425 Tommaso di Giovanni Guidi, o Masaccio, pintou numa parede da igreja de Santa Maria Novella, em Florença, sua Trindade, obra que os historiadores admitem ser a primeira expor uma noção consciente e sistemática da perspectiva linear.
Recentemente, em Do Androids Dream of Electric Sheep? que inspirou o filme Blade Runner: O Caçador de Andróides, o escritor norte-americano de ficção científica, Phillip Dick, discutiu a clonagem e, no extremo, a humanidade dos clones.
Esses exemplos equivalem a dizer que o avanço do conhecimento manifesta-se nas mais diferentes áreas e não é um privilégio exclusivo da ciência. Equivale a dizer também que a ciência não é algo à parte da cultura, mas exatamente algo que é parte da cultura.
Neste sentido, uma revista de astronomia, ainda que restrita à abordagem astronômica, como é o caso de Astronomy Brasil, pode recorrer às várias áreas da ciência, entre elas a história da ciência e história da astronomia em particular, para oferecer inteligibilidade possível aos temas de abordagens mais diversas.
Editar uma revista de astronomia, neste momento remete a um conceito que os gregos antigos chamaram de “Cosmos”, a idéia de harmonia, de se pertencer a um todo.
O futuro, já disse Konstantin Tsiolkvski, o pai da Astronáutica (“A Terra é o berço da humanidade, mas ninguém vive eternamente no berço”) está no espaço. Assim, uma revista de astronomia, com a qualidade de Astronomy Brasil, também deve ajudar a preparar a sociedade para os tempos que se aproximam.
Uma revista de astronomia deve ajudar professores e alunos a desenvolver uma nova abordagem do céu e da Terra. Deve permitir que leitores de formação, idade e interesses diversos abram uma nova janela para o céu. Deve fazer com que uma sociedade, como a brasileira, neste início de século 21, se dê conta, de forma mais prática e próxima, da diversidade do que os astrônomos chamam de animais de zoológico cósmico.
Ulisses Capozzoli
Presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico / Editor da Revista Astronomy Brasil
Saiba quem é: O jornalista Ulisses Capozzoli trabalha com divulgação de ciência desde 1983, nos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é autor de livros como “Antártida, a Última Terra” (Editora Universidade de São Paulo) e “Origem e Evolução da Vida” (Editora Ática). Editou a Revista Brasileira de Tecnologia do CNPq e escreve artigos que são publicados, a cada quinze dias, na página eletrônica do programa Observatório da Imprensa. É o atual presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico.