Sem-terrinha fazem encontro na UFSC
De repente, no meio do verde da grama que fica atrás do Restaurante Universitário, o vermelho assomou. Vermelho nos bonés e na bandeira estendida pelos sem-terrinha. São mais de 600, vindos de todos os 17 acampamentos e 122 assentamentos de Sem-Terra do estado. Meninos e meninas que vivem, cotidianamente, a luta pela reforma agrária, pela saúde, pela educação de qualidade e pelo direito de ser criança num país tão bruto. O Encontro Estadual dos Sem-terrinha vive, esta semana, sua terceira edição e está sendo promovido com a parceria do CED/UFSC, mais uma série de educadores e estudantes de tantos outros cursos que trabalham de forma sistemática com o movimento.
Um encontro como esse, que discute a infância e a luta pela terra, não poderia começar sem uma das belas místicas do MST. Um grupo de crianças representou a saga das famílias que vagam pelo estado, plantando em terra alheia, passando fome, frio e desespero. Até que, enfim, encontram o MST e a vida muda. Vem a luta, a ocupação, a resistência e a vitória, que é a terra e a produção. Do meio da terra brota a bandeira e do meio do povo brota a comida, vinda de várias direções até o centro do palco onde a união e a solidariedade marcam o final. Depois, o teatro, a música, a poesia. Tudo dentro do espírito lúdico e lutador, tão comum ao movimento. Os bonés vermelhos se mexem, o punho se ergue, o riso se faz. Os sem-terrinha estão em luta.
A atividade vai até o final da semana e conta com oficinas, visitas à escolas, passeios e até um encontro com o governador. Os sem-terrinha vão levar um documento, construído por eles mesmos nos vários encontros preparatórios. Querem que o governo garanta a reforma agrária, educação de qualidade, adequada ao meio rural, melhoria das estradas, transporte escolar, saúde, enfim, tudo o que é preciso para uma criança crescer feliz e com dignidade.
Os meninos e meninas do MST ainda vão fazer, nesta quinta-feira à tarde, um ato público no centro da cidade em defesa da Reforma Agrária e das Sementes. São contra os transgênicos que tiram das mãos dos agricultores o direito de manter vivas as sementes. Querem conversar com a sociedade e mostrar que a reforma agrária muda a vida deles e a de todo mundo.
Quem pode falar bem disso são Mara Camargo e Daniel Della Libera, os dois têm 11 anos e viveram por vários anos em acampamentos. Eles sabem o que é morar debaixo de lona, sem água, sem comida, sempre com medo da polícia, dos pistoleiros, sem saúde, sem educação. Hoje Mara vive no assentamento Sepé Tiarajú e Daniel no 30 de Outubro. Têm casa, comida e vida digna. Lutaram, junto com os pais, por esse tempo novo mas querem ver todos os seus companheirinhos que ainda vivem em acampamentos nessa mesma realidade. Por isso vieram ao encontro. Querem trocar experiências, aprender e ensinar. Querem que as crianças do Brasil inteiro possam ter direito à infância, ao riso, a alegria, ao estudo, à vida feliz.
Os sem-terrinha fazem tudo com muita seriedade. Sabem que a vida de cada um depende da luta que travam. Muitos já fizeram isso, lutaram e venceram, vivem nos assentamentos. Outros, ainda amargam os acampamentos mas trazem nos olhos a luz da esperança. Uma esperança que não é vã, é concreta, porque feita, no dia-a-dia, com as próprias mãos. Não é à toa que, em meio ao riso e às brincadeiras eles insistem no compromisso com a luta e gritam: “Bandeira, bandeira, bandeira vermelhinha. O futuro da nação está na mão dos sem-terrinha”.
E assim, até sexta-feira, a gurizada vai estar circulando pela UFSC. Vale a pena parar e conversar. Não há dúvida de que se tem muito que aprender com essa galera.
Maiores informações no 331.9786
semterrinha.doc/ Elaine Tavares