Acidentes ameaçam homens e animais na Serra Catarinense
Três das oito antas que viviam no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro morreram atropeladas nos últimos quatro meses. O último acidente foi no dia 17 de janeiro, quase um ano depois do primeiro aviso de policiais militares à Fatma (Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina), responsável pela administração da reserva ambiental, uma das maiores do sul do Brasil.
“Em fevereiro, antes de qualquer óbito, comunicamos à Fatma que animais estavam ultrapassando a cerca do parque por furos já existentes ou que eles mesmos fizeram”, diz o Comandante da Polícia Militar Ambiental do Parque, Capitão Emiliano Gesser.
Na segunda-feira, dia 21, outra denúncia foi encaminhada à Fatma. O presidente da Fundação, Carlos Leomar Kreuz, afirma que soube da morte das antas apenas nesta semana e que tomou providências de imediato: “Nosso pessoal já está encaminhando para a câmara técnica da Fatma um pedido para que se usem verbas do Sistema Nacional de Unidades de Conservação para financiar o cercamento do local.”
Há urgência em solucionar os problemas que “implicam em risco à vida de pessoas que transitam pela rodovia Evádio Paulo Broering (antiga SC 433),” alerta o professor Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho, do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele conduz um projeto de pesquisa sobre as antas da Serra do Tabuleiro, mas se preocupa também com outros animais que escapam da reserva e cruzam a auto-estrada. E não é o único: o Capitão Gesser já viu capivaras mortas na pista e fotografou as antas para provar o perigo à Fatma. “Mesmo assim eles não fizeram nada”, lamenta.
“Em outubro, um motociclista quebrou a clavícula e ficou afastado do trabalho por causa do primeiro acidente de 2007. No segundo, a frente do carro foi danificada pelo animal. Em ambos os casos, os condutores prestaram queixa na delegacia da Pinheira”, acrescenta. “Transeuntes vieram reclamar que um coletivo quase capotou quando fez uma manobra arriscada para não atropelar antas que estavam na via. Elas são animais de grande porte; a última – morta dia 29 de dezembro – tinha cerca de 1,30 metro de comprimento e uma altura de 80 cm.”
Todos estes detalhes ainda não haviam chegado ao conhecimento do Diretor de Proteção de Ecossistemas da Fatma, Gilmar Edson Koeddermann, até as 14h do dia 28 de janeiro. Nessa data ele declarou : “Assim que fui informado deste último fato, chamei a secretária executiva da Câmara Técnica e o chefe do parque para saber o motivo das fugas. A informação que me foi passada é que elas estão fugindo à procura de comida porque tem rompimentos no alambrado. Falta fazer a cerca para que elas não fujam da reserva.”
Ainda que deseje resolver o problema o mais breve possível “para evitar tragédias”, o diretor esbarra em entraves institucionais: “O Estado é burocrático e retarda ações. Nosso pessoal está em férias e retorna depois do carnaval. Na reunião de 14 de fevereiro vou determinar a alocação de uma verba para fazer 5 quilômetros dos alambrados que faltam e consertar o existente,” anuncia Gilmar.
Fapesc financia pesquisa sobre espécie em perigo
As antas já estiveram ameaçadas de extinção no Brasil, conseguiram se multiplicar, mas continuam na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais. Por esses e outros motivos a espécie é estudada no Parque da Serra do Tabuleiro, com o aval de uma Comissão de Ética e financiamento da Fapesc (Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa Catarina).
O projeto visa levantar informações que subsidiem ações de conservação, melhorias das condições de cativeiro e iniciativas de re-introdução de antas ao ambiente natural. As populações desses animais se encontram num quadro crítico, segundo o agrônomo Luiz Carlos P. Machado Filho. Os exemplares selvagens vêm desaparecendo por causa da caça e da redução de seu habitat natural, principalmente a Mata Atlântica, cuja extensão atual é inferior a 8% da original
Relatos de naturalistas dos séculos XVIII e XIX que passaram pela porção litorânea do parque – junto com pesquisas em museus nacionais e europeus – motivaram a criação do Projeto de Restauração da Fauna Desaparecida da Baixada do Maciambu em 1975. Entre seus idealizadores estava o Pe. Raulino Reitz, um dos maiores nomes da botânica no Brasil.
Ao longo dos anos esta iniciativa foi abandonada por falta de critérios técnico-científicos e de verbas. Como resultado, as antas (T. terrestris), emas (Rhea americana) e capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris) foram mantidas no recinto sem muitos cuidados até que a UFSC começou a estudá-los. A universidade recebeu dinheiro da Fapesc em dois projeto. O segundo está em andamento, mas deve resultar em dois trabalhos de conclusão de curso, uma dissertação de mestrado, quatro artigos de pesquisa e vários resumos e comunicações em eventos científicos.
Sucesso comprometido
No início da investigação havia cinco antas adultas e três filhotes; do total de oito, quatro eram machos e quatro fêmeas. Todos descendiam de dois animais de Rondônia e viviam em regime de semi-cativeiro. Essa situação ímpar – de semi-cativeiro em um hábitat natural único e altamente ameaçado, onde populações nativas de antas foram extintas há séculos – oferece grande potencialidade ao desenvolvimento de uma linha de pesquisa ecológica.
O entendimento de como as antas se adaptaram a o novo ambiente, principalmente do ponto de vista alimentar, é uma informação chave para o esclarecimento da dinâmica destes animais, já que os mesmos não existem mais em muitas áreas. Devido à visibilidade proporcionada pelo Centro de Visitantes do Parque Estadual, surgiu uma demanda por ações também junto a Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma).
Estes mamíferos desempenham um importante papel na comunidade vegetal, pois comem frutos e ajudam a dispersar sementes. “Estudos sistematizados referentes a grandes mamíferos são raros no Brasil e ausentes em Santa Catarina, com a exceção daqueles sobre pequenos roedores”, diz a proposta de pesquisa submetida à Fapesc. Ela teve êxito na proteção das antas até que os furos na cerca da reserva ambiental permitiu a fuga seguida de atropelamento dos bichos. “É triste de ver”, lamenta o professor Luiz Carlos. “Por isso solicitamos providências urgentes da Fatma, no sentido de tomar medidas que possam evitar mais mortes de animais – antas e outros.”
Por Heloisa Dallanhol/assesoria de imprensa da FAPESC
Contatos:
Comandante da Polícia Militar Ambiental do Parque, Capitão Emiliano Gesser :guesppmaproj@pm.sc.gov.br ou fone: (48) 3292-6000
Professor Luiz Carlos: cacopm9@hotmail.com