
Carlos: "A climatologia tem um lado mais humano"
O Conselho Universitário da UFSC concedeu na noite desta quinta-feira(18/9), no auditório da Reitoria, o título de Doutor Honoris Causa aos professores Carlos Augusto Figueiredo Monteiro e João José Bigarella, que trabalharam ativamente para a criação e consolidação da pós-graduação do Curso de Geografia da Universidade. A cerimônia foi presidida pelo reitor Alvaro Toubes Prata, e teve como participantes da mesa o presidente da Fapesc e ex-reitor da UFSC, Diomário de Queiroz, e o presidente do Conselho dos Curadores, Milton Luis Vieira, além dos homenageados.
Carlos Augusto Figueiredo Monteiro relembrou, a partir da cerimônia, o início do ano letivo de 1960, quando foi convidado a ministrar a aula magna da Faculdade Catarinense de Filosofia, o embrião da UFSC, localizada ao pé do Colégio Catarinense. “Havia a dúvida se aquela aula seria um adeus ou um até logo. Parti para o interior de São Paulo, dentre outros motivos, porque entendo que a gente sempre deve sair de cena quando está no auge. Hoje, aos 81, posso afirmar que dos 28 aos 32 anos, época em que vivi em Florianópolis, experimentei o período mais feliz da minha vida”.
Depois de dezessete anos se deu o retorno. “Vi que aquela Florianópolis não existia mais. A cidade tinha crescido, progredido, mas continuava encantadora. Visitei a Universidade no campus novo. Revi ex-alunos que já atuavam como docentes. Percebi então que a instituição que ajudei a fundar já estava firmada”.
As raízes com a cidade são muitas: desde os amigos queridos – principalmente a família Aquino, representada no auditório pelo reitor da Unisinos, Marcelo Fernandes de Aquino – até o time de futebol – “fui e ainda sou torcedor do Figueirense!”.
O professor ainda enfatizou as diferenças entre climatologia e meteorologia. “A climatologia tem um lado mais humano, que a meteorologia não tem. Esse diferencial deve ter feito sucesso, porque até hoje sou convidado a participar dessas coisas“, brincou, referindo-se à cerimônia.

Bigarella: "A pesquisa precisa ser transmitida"
João José Bigarella enfatizou que seus primeiros anos de vida foram fundamentais para sua formação. “Meus pais sempre me incentivaram a estudar e a adquirir livros – lia Pasteur, Darwin – e isso me despertou o interesse pela pesquisa de novos assuntos. Além disso, tive sorte; no curso ginasial, que terminei em 1949, lembro que os professores realmente nos estimulavam. Acredito que essa formação talvez tenha sido mais importante do que aquela adquirida na universidade”.
Em 1949 o professor começou a lecionar. “Quando se trabalha com pesquisa, ela precisa ser transmitida. Mas eu não tinha o dom da palavra, então usei muito o audiovisual e o trabalho em campo”. Ele entende que o pesquisador, como professor, precisa utilizar não só dos conhecimentos que estão nos livros, mas também os que acumulou em suas experiências pessoais. “Vejo a universidade como um grande Buda. A pesquisa é seu coração de brilhantes, e o conhecimento – o coração – deve ser levado até os braços, ou seja, até a comunidade”.
Foi através da pesquisa que, entre 1970 e 1980 o professor trabalhou na África e na Ásia. Na Índia analisou o porquê da pobreza sob o ponto de vista geológico. “As casas eram feitas de pau-a-pique, cobertas de sapé. Eu chegava e tirava os sapatos para entrar – e o piso era de chão batido. No centro da sala havia uma manjedoura, com uma vaca para a produção de leite e esterco. A gente se sentava no chão, a dona da casa trazia a comida e nós comíamos com a mão. Eram pessoas educadas, e também felizes. Achei a experiência um espetáculo!”, relata.
O reitor Álvaro Prata assinalou que, em 48 anos de existência, a UFSC concedeu dezoito títulos de Doutor Honoris Causa, sendo que os professores Carlos Augusto Figueiredo Monteiro e João José Bigarella representam os 19° e 20° homenageados. “A UFSC se afirma onde a qualidade prevalece sobre a quantidade. Queremos que ambos nos inspirem com suas carreiras e nos sirvam de exemplo pelo rigor acadêmico”.
A cerimônia ainda teve a participação do Coral da UFSC, que executou o hino nacional e o hino da Universidade, e também contou com a participação do grupo Harmônicas da Ilha – composto por professores aposentados da UFSC – que apresentou músicas tocadas com gaitas de boca e violão.
Quem são os homenageados
Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro é natural do Piauí , formou-se em Geografia e História em 1950 pela Faculdade Nacional de Filosofia, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ingressou em 1955 no ensino superior na Faculdade Catarinense de Filosofia, hoje Universidade Federal de Santa Catarina, e posteriormente foi professor de Geografia física junto à Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Rio Claro, São Paulo.
Em 1968 se integrou ao Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP, vindo a se aposentar como professor titular no ano de 1987, ano em que retornou à UFSC como colaborador visitante no curso de mestrado em Geografia onde permaneceu até 1990. Suas aulas sempre foram cuidadosamente preparadas e através da sua visão holística procurava despertar nos alunos curiosidades para as muitas outras áreas do saber.
Foi orientador de inúmeras dissertações e teses, coordenador de trabalhos sobre planejamento urbano e palestrante dos congressos da UGI -União Internacional dos Geógrafos, bem como dos encontros nacionais, especialmente os de Climatologia. Como pesquisador é autor de numerosas obras contendo mais de uma centena de títulos, especialmente na área de climatologia e meio ambiente, além de outros trabalhos inéditos. O rigor acadêmico e a qualidade inovadora dos seus trabalhos consagram-no como personalidade de renome na geografia brasileira e internacional.
João José Bigarella nasceu em Curitiba. Bacharel em Ciências Químicas pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras do Paraná (1943), químico industrial pela Escola de Química do Paraná (1945) e engenheiro químico pela UFPR (1953), trocou os laboratórios por um continuo trabalho de campo, mais em contato com a natureza, se dedicando intensamente à Geologia e, mais tarde, à defesa ambiental.
Em 1956 ingressou no ensino superior, tornando-se catedrático de Mineralogia e Geologia Econômica da UFPR. Colaborou também com os cursos de pós-graduação das universidades de Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, bem como da Universidade de São Paulo.
Desde 1985 é pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e é professor visitante da UFSC onde colabora com o programa de Pós-Graduação em Geografia , tendo prestado orientações em inúmeras dissertações e teses., realizado palestras e trabalhos de campo com alunos da Geografia.
Desenvolveu pesquisas geológicas e geográficas em vários países da América do Sul e da África, interessado principalmente na interpretação dos paleoambientes e nos problemas relacionados com a deriva continental. Publicou cerca de 230 trabalhos científicos no Brasil e no exterior (Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Holanda, Alemanha, Rússia e África do Sul).
Como presidente da Associação de Defesa e Educação Ambiental (1974 – 1994), em colaboração com outras instituições e pesquisadores, redigiu vários livros sobre a problemática ambiental. Pela Editora da UFSC – EdUFSC, publicou 3 volumes da série Estrutura e Origem das Paisagens Tropicais e subtropicais. O 4º está no prelo.
Por Cláudia Schaun Reis/jornalista na Agecom
Fotos: Jones João Bastos