REUNIÃO ANUAL DA SBPC: simpósio discute os caminhos da maricultura
Como conciliar a produção artesanal com a industrialização e a tecnologia? Este foi um dos tópicos abordados no simpósio “Qual o futuro da maricultura brasileira?”, que reuniu nesta sexta-feira o pesquisador Sérgio Winckler da Costa, da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) e os professores Jaime Fernando Ferreira, Elpídio Beltrame e Vinícius Ronzani Cerqueira, da UFSC. O evento integrou o último dia da 58ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.
O pesquisador do Centro de Desenvolvimento em Agricultura e Pesca da EPAGRI (Cedap) e mestre em Aqüicultura pela UFSC, Sérgio Winckler, lembrou que Santa Catarina é um dos estados com a aqüicultura mais desenvolvida do país, com destaque para a produção de ostras e mexilhões. O pesquisador, no entanto, advertiu que, para haver um crescimento contínuo e potencializado desta produção, é necessária a criação de um plano específico, junto a uma maior regularização e normatização da atividade. Dentro deste plano, deve haver a busca por novas áreas de cultivo e a regulamentação das já existentes.
Winckler destaca, também, a importância de buscar uma certificação sanitária e ambiental dos produtos através de cuidados conjuntos envolvendo as saúdes pública, ambiental e animal. Esta certificação, juntamente com a busca por novos mercados e por um maior beneficiamento para agregar valor aos produtos, seria imprescindível ao desenvolvimento da maricultura catarinense, que já desponta em novas áreas, como os cultivos de vieiras, polvos, macroalgas e peixes marinhos.
O professor do Departamento de Aqüicultura da UFSC e doutor em Oceanografia pela Université D` Aix Marseille II – França, Vinícius Cerqueira, falou sobre a piscicultura marinha no Brasil. Por possuir uma grande diversidade de peixes e diferentes demandas para cada espécie, Cerqueira lembrou que, para a piscicultura, precisamos procurar peixes com grande demanda, pouca oferta e alto valor de mercado. Segundo o pesquisador, não interessaria, por exemplo, a criação de sardinhas.
Entre os peixes estudados no sul do Brasil, Cerqueira destacou a tainha como precursora, visto que ela já é estudada desde os anos 1980. O seu preço baixo, no entanto, dificulta a criação. Outros peixes passaram a ser estudados a partir dos anos 1990, como o linguado e o peixe-rei, mas o destaque fica por conta do robalo que, além de ter um alto valor de mercado e ser conhecido por toda a costa, pode ser cultivado em diferentes ambientes e possui bom tamanho, carne de qualidade e boa taxa de crescimento.
Para o desenvolvimento de novas espécies, o professor ressaltou que clima e mercado devem sempre ser levados em conta. Como perspectivas para o futuro, Cerqueira enxerga o desenvolvimento da tecnologia para a criação de novas espécies e espera que esta tecnologia possa chegar aos pequenos produtores.
Professor do Departamento de Aqüicultura e doutor em Geografia pela UFSC, onde pesquisou Seleção de Sítios e Planejamento da Atividade de Cultivo de Camarões Marinhos com Base em Geotecnologias, Elpídio Beltrame, falou da sua experiência no estudo da carcinicultura (criação de camarões). A produção, que ainda sofre com os efeitos do vírus da mancha branca que atingiu a atividade, encontra-se em pausa por causa do inverno. Beltrame afirma, no entanto, que já existe um projeto de trabalho integrado junto às associações de produtores para tratar de alternativas para os sistemas de produção. Questões como genética, resistência e controle da enfermidade também estão merecendo pesquisas próprias e podem colaborar para a prevenção de problemas futuros.
Beltrame falou, também, da necessidade de agregar valor aos produtos por meio do seu processamento e da certificação da sua qualidade, garantindo melhor suporte e recursos para o início da produção. O cultivo de algas foi outra pesquisa que mereceu a atenção do professor. Muitos produtos biofarmacêuticos já são extraídos de bancos de algas naturais, que poderiam ter a sua produção ampliada com o auxílio da aqüicultura. Outras utilizações, como na alimentação humana, tratamento de efluentes e fabricação de biodiesel, merecem destaque. Nos laboratórios de reprodução do Departamento de Aqüicultura da UFSC já são utilizadas microalgas na alimentação dos larvários.
O supervisor do Laboratório de Moluscos Marinhos e pós-doutor em Genética Animal pela Plymouth Marine Laboratory – Inglaterra, Jaime Ferreira, comentou os problemas enfrentados pelos maricultores catarinenses, como a falta de procedimentos claros, a dificuldade do acesso ao crédito, a demora para que os processos de cultivo sejam aprovados e a falta de programas governamentais específicos. Por outro lado, os órgãos de fomento e controle também enfrentam problemas, pois desconhecem as circunstâncias locais e a multiplicidade de pequenos processos, como também falta a eles um procedimento participativo. As conseqüências, segundo o pesquisador, são a informalidade, a baixa tecnologia e o baixo investimento que, por sua vez, causam baixa produção, baixo aproveitamento e baixa qualidade.
Planos locais de desenvolvimento da maricultura, no entanto, já estão sendo desenvolvidos. Ferreira destaca a mecanização dos processos e a industrialização como formas de agregar valores aos produtos. O professor ressalta, no entanto, que deve haver um equilíbrio entre as produções artesanal e industrial, para que a maricultura possa continuar sendo feita por famílias de baixa renda e continue cumprindo a sua função social, que é a de manter os pescadores perto do mar e ajudar na organização das comunidades.
Por Daniel Ludwich/bolsista de jornalismo da Agecom