Estudantes da UFSC criam projeto social de valorização de autoras mulheres por meio da leitura
O projeto social Nós Lemos Mulheres abriu vagas para participação de encontros semanais de leitura de livros escritos por mulheres. A iniciativa é fruto do trabalho de Gabriela Nardini, Mariana Chavegatto, Izabella Carminatti e Julia Rodrigues, alunas graduandas do curso de Administração da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O objetivo é valorizar autoras mulheres e combater a desigualdade de gênero na literatura, em encontros realizados por meio de videochamadas, com grupos de até 10 pessoas. Para se inscrever, é necessário preencher o formulário.
A organização utilizada nos encontros é inspirada no método cumbuca, criado pela empresa Falconi Consultorias. “O nome do nosso encontro é VAM, que significa Valorizamos Autoras Mulheres. Se tornou algo com um propósito tão forte que quisemos mudar o nome para realmente manter essa cultura”, explica Gabriela Nardini, e acrescenta “essa metodologia é para ter compromisso com a leitura, então a gente lê semanalmente, tem uma pessoa que guia, tem algumas regras, e isso incentiva a ler com frequência.”
As VAM’s são montadas a partir do volume de inscrições feitas, que ficam abertas e com formulário disponível no perfil oficial do projeto no Instagram, @noslemosmulheres. A partir do momento em que pelo menos seis pessoas realizam a inscrição, um grupo é formado, e dentro dele será decidido o livro que será lido e o horário dos encontros, com duração média de uma hora. “Estamos rodando duas VAM’s, uma delas é com o livro O Morro Dos Ventos Uivantes e a outra é A Coragem de Ser Imperfeito. Quando chega no dia, é feito um sorteio trinta minutos antes para ver quem vai ser a guia daquela VAM, quem vai ser a motorista. A motorista tem a missão de trazer reflexões que ele teve ao longo da leitura”, explica Mariana Chavegatto.
O objetivo do sorteio ser realizado apenas meia hora antes é para que a leitura seja feita com a mesma intensidade por todas as participantes. “É realmente dessa forma para todo mundo ter questionamentos, ideias, correlações e fazer o grupo discutir de uma forma amigável e tranquila durante o encontro”, pontua Izabella Carminatti. As regras dos encontros são flexíveis, mas a honestidade e o compromisso com a leitura são pontos cruciais citados pelas organizadoras.
Reflexões e impactos
“Fazia um tempo que não conseguia manter uma rotina constante de leitura e o grupo me ajudou muito com isso”, relata Lara Pinheiro, participante do projeto. Lara também vê nas discussões em grupo um momento para expandir a sua perspectiva de realidade, relacionando a leitura a questões do cotidiano. “Acabamos trazendo muitas discussões sobre empoderamento de mulheres, equidade, feminismo. Por ser somente mulheres lendo mulheres, de uma forma muito natural e automática, trazemos essas pautas”, pontua Izabella Carminatti.
Monike Gandra, também participante, nota como a leitura semanal tem sido benéfica e estimula seu conhecimento. “ Buscar por autoras tem proporcionado conhecer temáticas e abordagens que muitas vezes passam batidas” ela descreve, e complementa “sem dúvida nos oferecem mais repertório sobre a forma como entendemos o mundo e as nossas possibilidades.”
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Ao exercitar o pensamento sobre diferentes pautas, torna-se mais comum associá-las ao dia a dia e notar suas interferências. Após a criação do projeto Nós Lemos Mulheres, questões como a falta de referências a mulheres em bibliografias acadêmicas e o uso de pseudônimos ficaram mais evidentes tanto para as participantes quanto para as organizadoras. “Nós líamos automaticamente livros de homens. No momento que você coloca isso na cabeça, começa a perceber isso em outros lugares e a propagar isso”, explica Julia Rodrigues.
Por buscarem a valorização do trabalho realizado pelas autoras, o projeto incentiva a compra individual dos livros para a leitura, apesar de não ser uma regra. “Escolheram um livro e as meninas zeraram o estoque na Amazon. Aquilo mostrou para nós que o nosso impacto é grande sim. A gente mostrou que tem demanda, que precisa ter esses livros, que tem gente querendo ler esses livros”, conta Julia sobre uma das últimas VAM’s.
Conexões
O projeto, registrado como uma ação de extensão, foi construído a partir de um trabalho na disciplina de Gestão de Projetos, e é coordenado pelo professor Marcos Bosquetti. A princípio, por conta do isolamento social, não havia a obrigatoriedade em aplicá-lo, mas o engajamento das alunas com a pauta fez com que fosse inevitável tirá-lo do papel. “Nós éramos muito acostumadas a ler vários livros de desenvolvimento pessoal, profissional e principalmente no âmbito dos negócios. Nós líamos poucas mulheres, não foi uma pesquisa que fizemos, foi um sentimento, um questionamento” conta Gabriela, e complementa “resolvemos criar esse grupo para começar lendo um livro, faz um ano agora em julho desde que criamos esse grupo, são mais ou menos 10 meninas, já lemos quatro ou cinco livros esse ano.”
Além da leitura dos livros, as integrantes do projeto passaram a utilizar o espaço para criar conexões. “Por conta da pandemia, paramos de ver gente, paramos de nos relacionarmos com outras pessoas, passamos a viver muito em uma bolha, e foi muito esse ponto de criar uma nova rede, para que conheça novas pessoas, fazer novas amizades mesmo”, explica Mariana Chavegatto. Por utilizar a modalidade remota, os grupos são acessíveis para diversas regiões, faixas etárias e nichos sociais.
O público-alvo continua sendo feminino, apesar de não haver restrições quanto ao sexo. “Nós nos comunicamos com mulheres, tem até uma frase do livro que estávamos lendo, Cidade das Garotas, que é ‘quando a gente está apenas entre mulheres, a gente só precisa ser’, e é essa a sensação que estamos causando”, explica Gabriela sobre as publicações no Instagram e formação de grupos atuais.
Futuro
Com o aumento no volume de VAM’s, as organizadoras planejam que estas sejam cada vez mais independentes. “Temos o plano de criar o grupo e falar todas as regras para elas. Vamos ser as motoristas do primeiro encontro, e no próximo elas vão ser as motoristas. Quando elas terminarem esse livro ou chegarem mais no final, a VAM é delas”, declara Gabriela, que vê essa independência como algo que possibilita a criação de um elo mais forte entre as participantes.
Para a página no Instagram, há planos para que, no futuro, seja um local para divulgação de livros e participação de autoras. “Por ter um alcance maior, então as meninas da VAM vão poder participar, mas outras pessoas que não podem fazer o encontro semanal também vão ter acesso àquela reunião e àquela autora”, contra Julia Rodrigues.
Luana Consoli/Estagiária de Jornalismo da Agecom/UFSC