Fundador do movimento Slow Food ministra palestra sobre gastronomia e consumo consciente
O fundador do Movimento Slow Food, Carlo Petrini, esteve na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) na tarde desta terça-feira, 7 de novembro, para ministrar uma palestra sobre o assunto. A atividade foi realizada no auditório do Centro Socioeconômico (CSE), e foram debatidos assuntos como agricultura familiar, consumo responsável e o impacto que a produção de alimentos tem em diversos setores da sociedade.
Carlo Petrini explicitou o conceito de gastronomia como uma ciência multidisciplinar, que vai além da culinária. “A gastronomia também é agricultura, zootecnia, biologia, química e física. A gastronomia, no nível humano, também é antropologia, história da cultura, é nossa identidade”. Além dessas áreas, o jornalista destacou que a gastronomia envolve economia política, porque as inúmeras disputas por terra que aconteceram na história da humanidade foram lutas pelo poder ligado à produção de alimentos. A distorção do conceito de gastronomia, segundo Petrini, está ligada a um paradoxo: “Nunca se falou tanto de comida, e a situação agrícola é um desastre, em qualquer parte do mundo. Essa visão induz a pensar mal, não é educativa”.
Fizeram parte da mesa a facilitadora do movimento Slow Food no Sul do país, Gisele Miotto, o produtor agroecológico, Antonio dos Santos, e o professor de Administração da UFSC, René Birochi. Miotto, em sua fala, levantou um questionamento sobre o papel de cada um como consumidor. “Não é só consumir, não é só sobre o meu estômago e o meu bem-estar. É dar um retorno para a comunidade”, ressaltou. “Todo o processo antes da comida estar no meu prato é uma luta que os produtores estão empreendendo para continuar existindo.” Miotto contou que, enquanto facilitadora do Slow Food no Sul do Brasil, o desafio mais latente que apareceu foi a falta de flexibilização das leis sanitárias e ambientais relacionadas com a agricultura familiar. Mas também viu muitos pontos positivos: “A capacidade de resiliência frente ao golpe e o desmonte de direitos ligados à agricultura familiar, e a força da juventude no meio rural”.
Petrini falou sobre a concentração de riqueza, que vem mostrando sinais de acentuamento nos últimos anos. “O poder de produção de alimentos, os fertilizantes químicos, a medicina. Em poucas mãos se tem toda a vida”, observou Petrini. “A maior parte das terras no mundo não são usadas para produzir comida para as pessoas, mas para os animais que as pessoas comem. E se todos no mundo fossem consumir a carne que os americanos e os europeus comem, seriam suficientes quatro planetas. Isto é gastronomia?”, questionou.
Outra questão que Petrini apontou foi o êxodo rural. “Em 2008, pela primeira vez na história da humanidade, o número de habitantes das cidades superou o número de habitantes do campo. De lá para cá, esse êxodo rural se intensificou de maneira incrível. Os jovens não querem e não podem viver no campo: paga-se pouco, não há socialização”, afirmou Petrini.
Sobre as duas maneiras excludentes de produção de alimentos: a agroecologia e o agronegócio, Petrini alertou: “Nunca antes se confrontaram duas visões tão diferentes sobre alimentação”. Em um sistema que utiliza como dimensão o preço, e não o valor real dos produtos, Petrini realçou que o movimento Slow Food se posiciona por uma maneira de produzir e consumir que seja justa, saudável e prazerosa.
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Carlo Petrini é jornalista, escritor, presidente e um dos fundadores do movimento internacional Slow Food. Ele foi considerado uma das ’50 pessoas que poderiam salvar o mundo’ pelo jornal The Guardian, em 2008. O Slow Food é uma associação sem fins lucrativos fundada na Itália, em 1986, e defende o acesso a alimentos ‘bons, justos e limpos’, como também o consumo consciente e responsável.
Lavínia Beyer Kaucz / Estagiária de Jornalismo / Agecom / UFSC
Fotos: Henrique Almeida / Agecom / UFSC