Departamento de Enfermagem da UFSC finaliza participação no Projeto Haiti com mais de 1.500 agentes de saúde capacitados

11/12/2014 18:12
Alunos haitianos do Projeto Haiti em sua capacitação coordenada por professores do Departamento de Enfermagem da UFSC. (Foto: Arquivo Pessoal)

Alunos haitianos do Projeto Haiti em sua capacitação coordenada por professores do Departamento de Enfermagem da UFSC. (Foto: Arquivo Pessoal)

A Universidade Federal de Santa Catarina, por meio do Departamento de Enfermagem, encerra sua participação no Projeto Haiti, programa coordenado pelo Ministério da Saúde e realizado no Haiti desde 2010, com a capacitação de mais de 1.500 pessoas. Os novos profissionais receberam formação para atuar na reestruturação dos serviços de saúde haitianos após um catastrófico terremoto que agravou os problemas sociais do país. O projeto começou em 2010, logo após o terremoto, e é uma cooperação tripartite entre Brasil, Haiti e Cuba, com investimentos no valor de R$ 123,7 milhões. Trata-se do maior investimento brasileiro em cooperação internacional até hoje.

Dentre os objetivos alcançados pelo projeto estão a construção de três hospitais comunitários de referência, a reforma e construção de dois laboratórios regionais de saúde pública, a construção do Instituto Haitiano de Reabilitação, além da doação de veículos, equipamentos e insumos médicos. Outras ações foram realizadas por meio de convênios com instituições de ensino, como a UFSC, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e a Fiocruz, e com parceiros internacionais como a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNDU) .

A coordenadora do programa na UFSC, professora Flávia Regina Souza Ramos, esclarece que o foco principal era o fortalecimento do sistema de saúde e de segurança epidemiológica do Haiti, com a formação de pessoas de nível médio como agentes de saúde comunitários polivalentes, auxiliares de enfermagem polivalentes e inspetores sanitários, concentrados nas regiões onde foram construídos os hospitais. Foram titulados 1.555 alunos, sendo 1.226 agentes de saúde, 276 auxiliares de enfermagem e 53 inspetores sanitários.

A experiência foi especialmente bem-sucedida pelo seu caráter descentralizado. Um caso destacado como exemplar foi o da Comuna Carrefour, região haitiana onde foi construído o primeiro hospital brasileiro. Após a inauguração do hospital, as equipes já capacitadas pelo programa, juntamente com os médicos de Cuba, estão atuando de forma articulada, com bons resultados. “Está sendo tão positivo que o Ministério da Saúde do Haiti está avaliando essa Comuna como um exemplo a ser implantado em todo o país. Pela primeira está em funcionamento um modelo de organização da atenção primária, com territorialização, cadastramento das famílias, visitas domiciliares, ações de promoção da saúde. Essa é a grande satisfação ao final deste projeto”, analisa a professora Flávia Ramos.

Outra grande conquista foi a aprovação do currículo dos agentes de saúde comunitária polivalentes, proposta formulada pela equipe da UFSC e Ministério da Saúde/Brasil e validada pelos três países, que se se tornou referência nacional, conforme determinação do Ministério de Saúde Pública e População do Haiti.

“O currículo que construímos com eles para o agente comunitário passou a ser, por lei, o currículo oficial para todo o Haiti. Isso é importante porque o Haiti é muito dependente de ajuda externa, então muitas entidades internacionais implantavam processos diferentes, com formação de dez, quinze dias. A nossa formação é de quatro meses, teórico-prática, e é discutida e validada pelos gestores do país. A partir de agora, quem quiser oferecer ajuda e formar agentes precisa seguir o currículo”, explica a coordenadora.

Estratégia testada no Brasil

O Projeto Haiti foi firmado em 2010 e já formou mais de 1300 profissionais para atuarem na área da saúde. (Foto: Arquivo Pessoal)

O Projeto Haiti foi firmado em 2010 e já formou mais de 1300 profissionais para atuarem na área da saúde. (Foto: Arquivo Pessoal)

O planejamento do curso de formação, conta Ramos, segue os moldes da Estratégia Saúde da Família (ESF) do governo federal brasileiro, adaptado à realidade do Haiti. “A ideia é formar uma rede de serviços como a brasileira, com agentes comunitários atuando na atenção básica e tendo, na outra ponta da rede, os hospitais construídos pelo Brasil”, ressalta a coordenadora do projeto na UFSC.

O trabalho da equipe brasileira começou antes da oferta dos cursos, durante o preparo para a execução dos processos seletivos. Para o caso dos agentes comunitários, por exemplo, as seleções foram feitas com o apoio das comunidades, por meio das lideranças locais. A coordenadora explica que, para promover a aceitação positiva do agente já formado, foram feitas reuniões com as lideranças, e estas posteriormente estimularam a população a participar da seleção e divulgar as oportunidades.

Ramos lembra que as seleções para as turmas de formação “eram verdadeiras operações especiais”, com filas dobrando o quarteirão. “Muitas pessoas mesmo, todas ali para ter uma oportunidade de formação e uma possibilidade de um futuro emprego. Isso representava um acesso à cidadania, e eles se agarravam a isso com toda a vontade”, explica.

“O nosso projeto incluiu a elaboração das bases, currículo, materiais didáticos, cadernos de formação, tradução e validação desses materiais, além da capacitação de professores na língua francesa. Tivemos que contar com uma equipe permanente, incluindo um técnico que residia no Haiti esse tempo todo. Outros consultores da equipe passavam cerca de 10 a 15 dias por mês lá. Nós não tínhamos condições de trabalhar com essa proximidade, então acompanhamos daqui e fazemos visitas periódicas”, detalha Ramos. As pessoas contratadas, segundo explica a coordenadora, foram indicadas pelo Ministério da Saúde por atuarem nesse tipo de formação no Brasil ou pelo próprio Programa de Pós-Graduação e do Departamento de Enfermagem da UFSC.  O projeto contratou, ainda, a Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (FAPEU) para operacionalização  do convênio.

“Ao longo do treinamento, lentamente eles [a equipe no Haiti] ganharam autonomia para desenvolver as atividades sozinhos, com equipe própria de haitianos e com acompanhamento do Ministério da Saúde do Haiti. Depois de formados, os profissionais passam por um período de inserção, recebendo uma bolsa e trabalhando nesse modelo até a saída total da gestão do Brasil e a saúde pública do Haiti poder assumir esses trabalhadores contratados e manter a continuidade dos serviços”, detalha Ramos.

A coordenadora salienta que o índice de aproveitamento – 73% – é muito positivo, considerando-se a realidade do país. Ramos relata dificuldades de comunicação, transporte e instabilidade política e social. “Estamos bem satisfeitos com os resultados, apesar de todas as dificuldades. É muito difícil manter processos de formação e de inserção com as dificuldades que eles têm. Por isso, a bolsa brasileira serve para propiciar que eles estudem e depois façam esse estágio de prática no serviço”, destaca.

Os resultados animadores vieram em meio a várias dificuldades. “Foi desafiador. O tempo todo havia uma reformulação de planejamento, porque a situação mudava. As condições, que a princípio eram para estar asseguradas, não estavam. Só que ao mesmo tempo você aprende muito, porque é um povo muito sofrido que valoriza muito a educação. Você vê o empenho desses estudantes”, conta a coordenadora.

O Projeto Haiti encerrou esta primeira etapa em dezembro de 2014. Uma segunda etapa foi anunciada, mas ainda não há definições quanto aos recursos e atividades de continuidade que serão desenvolvidas. “Sabemos que o país não tem condições e que solicitou oficialmente para que essa etapa de inserção profissional continue por mais tempo e novos agentes sejam formados. Apesar da instabilidade, conseguimos concluir a formação até o final do projeto, mas sabemos que eles têm dificuldades para manter esses profissionais e os hospitais já entregues pelo Brasil”, explica Ramos.

Apresentação dos resultados

A UFSC esteve presente no Seminário Internacional “Saúde no Haiti e os Desafios da Cooperação Sul-Sul – Lições aprendidas do Projeto Brasil-Cuba-Haiti”, realizado em Brasília nos dias 27 e 28 de novembro. Representaram a instituição a professora Flávia Ramos, o secretário-adjunto de Relações Internacionais, Aguinaldo Pinto, a chefe do Departamento de Enfermagem, Maria Itayra Coelho Padilha, e demais membros da equipe.

Autoridades dos três países e parceiros assistiram ao evento, assim como especialistas de diferentes setores. Durante o seminário foram apresentados os resultados, as lições aprendidas e as perspectivas para a próxima fase do projeto.

 

Saiba mais:

Projeto Haiti – Ministério da Saúde – Governo Federal
Pós-Graduação em Enfermagem atua para melhorar saúde no Haiti

 

 

Mayra Cajueiro Warren
Jornalista / Diretoria-Geral de Comunicação
imprensa.gr@contato.ufsc.br

 

Tags: enfermagemministério da saúdeProjeto HaitiUFSC