Dissertação do Design envolve usuários na criação de aplicativo para celular

13/06/2013 15:46

Dissertação defende importância de envolver usuários durante desenvolvimento de software. Foto: Gabriel Cardoso

No mundo dos aplicativos para celulares, criar um produto capaz de encantar o público tem sido um dos objetivos cada vez mais almejados pelas empresas. Mas quais são as estratégias para se chegar a esse produto? Como descobrir o que as pessoas querem? Como envolver o usuário no processo de criação de um aplicativo? Questões como essas fizeram parte da dissertação defendida em abril no curso de Pós-Graduação em Design da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pelo designer Gabriel Cardoso, que teve como foco a avaliação da experiência do usuário (User Experience ou UX).

Os resultados de sua pesquisa estão registrados na dissertação “Avaliação de Experiência do Usuário durante o desenvolvimento de um aplicativo social móvel”, que teve orientação da professora Berenice Gonçalves. Um dos objetivos da dissertação é compreender como avaliar a experiência do usuário. “Experiência do usuário ainda carece de um entendimento consensual. É frequentemente confundida com avaliação de usabilidade e não há clareza sobre como avaliá-la”, explica o pesquisador. O campo é relativamente recente, ganha cada vez mais destaque e tem como foco buscar entender os interesses dos usuários. Se nas últimas décadas, o diferencial de um produto era a funcionalidade e a usabilidade, hoje os usuários esperam mais que isso: o prazer pelo uso.

Uma das contribuições da dissertação é sistematizar a literatura sobre experiência do usuário, delimitado como a interação com mediadores específicos, com sistemas dotados de interface de usuário. “A leitura de um livro, por exemplo, não estaria dentro do campo de estudo da experiência do usuário, mas a leitura de um e-reader sim, por ser a interação com uma interface gráfica”, explica Gabriel. Além da fazer a pesquisa teórica, Gabriel identificou diversas abordagens de pesquisa com usuários. E foi a campo para colocar em prática sua pesquisa. Ao entrevistar os usuários de celulares, seu objetivo era saber não apenas como um produto pode funcionar melhor, mas também como as pessoas experimentam a interação com um software. Para conseguir testar, Gabriel desenvolveu um protótipo de aplicativo, e incluiu a avaliação dos usuários em diferentes etapas do processo. Ele contou com a ajuda da graduanda em Arquitetura Cristina Silveira Basso, também idealizadora do aplicativo, e do estudante de Design e bolsista Diego França.

Etapas da pesquisa

A participação dos usuários começou como fonte de informação para as ideias iniciais para o aplicativo: um sistema que permite que uma rede de amigos consiga criar eventos, marcar encontros e reuniões. Depois, foram organizadas três etapas de avaliações. A primeira teve por objetivo testar a usabilidade e a utilidade. Para isso, foi utilizado um protótipo de baixa fidelidade, ou seja, uma espécie de rascunho do projeto que permitia fazer algumas tarefas no celular. Gabriel fez as entrevistas no contexto em que o aplicativo seria utilizado: em bares, lanchonetes e residências. Foram cinco entrevistados. Cada um teria que realizar seis tarefas e depois responder a uma entrevista. As informações obtidas serviram de base para a próxima etapa, que era a criar uma interface muito próxima do que seria o aplicativo final.

Na segunda etapa, o objetivo foi avaliar a estética. O teste foi feito com vinte pessoas, que avaliaram duas propostas de interface de um protótipo não interativo. “As imagens eram tão parecidas com um aplicativo real que as pessoas clicavam e esperavam que realmente funcionasse”, relata Gabriel. O pesquisador exibia uma imagem e depois perguntava as reações das pessoas em relação à interface. Esta reação era anotada em uma escala, atribuindo uma nota para uma variação das qualidades, como, por exemplo, desagradável/agradável, amadora/profissional, poluída/limpa, entre outras. As avaliações serviram para fazer ajustes nas interfaces. Nesse momento, os entrevistados fizeram críticas e deram opinião, o que ajudou na hora de refazer o protótipo.

A terceira e última etapa teve por objetivo avaliar a experiência como um todo, em seus diferentes fatores. “Com base nas avaliações anteriores, já tínhamos refinado a interface e queríamos saber se houve avanços”, explica Gabriel. Seis entrevistados foram a um laboratório de pesquisa para participar de sessões de utilização de um protótipo interativo com imagens de alta fidelidade – ou seja, algo muito próximo de um aplicativo real. Quanto à utilidade, as avaliações foram próximas à da primeira eta. O pesquisador esperava uma avaliação melhor sobre a usabilidade, mas os avanços foram pontuais. Em relação à avaliação estética, houve avanços consideráveis.

Esta última etapa da pesquisa também enfocou três aspectos mais subjetivos. Um deles foi verificar a escala de afeto, ou seja, quais emoções e sentimentos foram suscitados ao utilizar o aplicativo. Ao longo do teste, o participante atribuía valores a palavras que descreviam estados como interessado/irritável, aflito/alerta, empolgado, nervoso. Outro enfoque foi na qualidade da interface, em que o usuário atribuía notas a características como “desagradável/agradável, amadora/profissional, fria/aconchegante”. O atendimento de necessidades psicológicas foi medido por meio de critérios como relação de pertencimento, significado, estímulo, competência, segurança e popularidade.

Gabriel Cardoso durante a defesa de sua dissertação, defendida na Pós-Graduação em Design. Foto: Cristina Silveira Basso

Ao todo, Gabriel testou oito abordagens de pesquisa com os usuários, a maioria por meio de observação, entrevista e anotação, e pouco uso de laboratórios e gravações de vídeos. “A proposta desta dissertação era testar métodos mais baratos e rápidos”, explica. O pesquisador concluiu que avaliar o mais cedo possível evita retrabalho e ajuda a reduzir custos. A participação do usuário ao longo do desenvolvimento possibilitou aperfeiçoar a experiência oferecida de maneira incremental. “Quanto mais necessidades psicológicas e mais afetos positivos o aplicativo proporcionar, mais positiva será a experiência do usuário”. Gabriel explica que, com a evolução das interfaces, as empresas precisam oferecer cada vez mais, não basta ter só um produto útil e com boa usabilidade. Precisam também atender a outras necessidades dos usuários. “As empresas vão precisar ser capazes de oferecer a melhor experiência, oferecer um produto que seja capaz de proporcionar experiências positivas, com afetos positivos para as pessoas”.

Uma de suas recomendações é envolver o usuário sempre que possível. “De acordo com Jacob Nielsen, se você quiser melhorar a usabilidade, faça o teste com cinco usuários e detecte 80% dos problemas”, explica Gabriel. “Mas se a empresa não tiver recursos e conseguir testar apenas com dois, isso já vai trazer feedbacks que de outra forma não seria possível”, complementa. Para o pesquisador, é possível obter resultados positivos para o processo sempre que se envolve o usuário, buscando entender suas necessidades, sua forma de pensar e o que ele quer fazer. “As empresas estão começando a ir nesta direção”, completa.

Abordagens de pesquisa estudadas:

– Escala de utilidade (instrumento)
– Teste de usabilidade (observação da interação + entrevista) (método empírico de avaliação da interação)
– Escala de usabilidade (instrumento)
– Observação da reação visceral (técnica)
– Escala de reação inicial (instrumento)
– Escala de percepção das qualidades da interface (instrumento)
– Escala de afeto positivo e afeto negativo (Positive Affect/Negative Affect Scale – PANAS) (instrumento)
– Escala de atendimento de necessidades (instrumento)

Mais informações:
Gabriel Cardoso – gabrielc.cardoso@gmail.com


Laura Tuyama / Jornalista da Agecom / UFSC

laura.tuyama@ufsc.br 

 

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